quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

a escola é local de desenvolvimento da inteligência, e não de estupidificação da mesma.
o problema dos historiadores é estudarem tanto o passado que acabam vivendo nele.

terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

o mundo seria bem melhor se as pessoas pensassem metade daquilo que pensam e se fizessem o dobro daquilo que fazem.

o mundo seria bem melhor se as pessoas pensassem metade daquilo que dizem e se fizessem o dobro daquilo que pensam.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2007

«Ó Senhor Professor
Que é de seu nome?»
«É professar a dor
Onde quer que me assome»

Que é ser-se professor
neste mundo de mentira
senão perpetuar ardor
que à alma chegue e fira?
todo o poema
é um universo sem fim
porque nele cabe tudo
o que existe em mim

e todo o homem
é o universo sem fim
porque é ele poema
o poema que há em mim

e tudo o que existe
é universo sem memória
aquilo que em mim assiste
é o passar da história
minha passagem para o breve, breve instante da loucura

Ary dos Santos, em Cavalo à Solta
hoje sinto-me feliz, e não sei porquê. Se soubesse, estragaria toda a felicidade que há em mim.
Ver aquilo que esconde a superfície ou apenas o que fica sobre ela? Qual o caminho a seguir? Se é certo que o que sustenta a casa é aquilo que verdadeiramente a mantém de pé, também é certo que o que vemos primeiramente, e aquilo com que lidamos diariamente, é a casa, e não o alicerce. Assim, vale mais conhecer o visível para depois podermos procurar o invisível, informar-nos acerca do que se fala para depois podermos descer ao que se sente, mergulhar na apatia para que possamos descobrir a voz da revolução. E, mais a mais, se não conseguimos lidar com o óbvio, então como é que havemos de querer aspirar a conhecer o não óbvio?
até descobrir o que era a literatura, nunca tinha pensado que se podia sonhar tanto pelo mundo.
Todas as noites o senhor Palomar e a senhora Palomar acabam por afastar os cadeirões da televisão, colocando-os ao pé do escaparate; sentados no interior da sala, ficam a contemplar a silhueta esbranquiçada do réptil sobre o fundo escuro. A opção entre a televisão e a osga nem sempre é feita sem incertezas; cada um dos espectáculos fornece informações que o outro não dá: a televisão move-se pelos continentes, recolhendo impulsos luminosos que descrevem a face visível das coisas; a osga, por sua vez, representa a concentração imóvel e os aspectos escondidos, o outro lado daquilo que aparece à vista.

Italo Calvino, em Palomar
a tarefa que há a fazer é casar a arte com a ciência e a ciência com a arte.

domingo, 25 de fevereiro de 2007

o físico é a expressão mais exacta do psíquico. Já repararam no homem de cabelo desgrenhado que caminha pela rua? Um despenteamento capilar é a prova física da existência de uma desordem interior. Também existem aqueles casos dos que se penteiam muito bem, cabelo cortado à escovinha, sempre direito e recto. Tiveram uma educação militar, com certeza, ou então pensam que o mundo é algo estático. O cabelo é aquele que mais fala neste casos. Depois dos olhos, claro - mas esses são mais que físicos, não se pode ter em conta algo que não é verdadeiramente físico.

sábado, 24 de fevereiro de 2007

não podemos conhecer alguém se não nos queremos dar a conhecer.
o Vaticano é o maior centro comercial religioso do mundo.
diz a mãe tão indiferente
efémero dia sem desgosto
diz o pai trabalhar é gente
do nascer ao sol posto

mil morrem nestas ruas
outros mil já o estão
dos mil que a doença traga
outros mil se seguirão

passa o dia e passa bem
passa mal quando calha
ninguém sabe o que é sem
ter tempo para a tralha

mas o sol sempre brilha
e o estertor ainda é vida
os outros que façam fita
que não conheço despedida

tempo voa contra nós
aquele que relógio conta
fabricado é ele por vós
ninguém sabe como' monta

mas em vez de televisão
e mais longo que entrudo
é olhar para o presente
com olhos de futuro

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

Seria mais adequado descobrir como poderíamos transformar os velhos modelos de descodificação para que a pessoa liberte o seu próprio padrão de descodificação espontânea.

William Burroughs, A Revolução Electrónica
a coisa mais terrível é ver o medo no nosso próprio rosto.

William Burroughs, em A Revolução Electrónica
«Olá menino. Que grande!
Tão alto, é quase homem
Parece que ontem era só colo
Os anos aos anos se somem

E quando cresceres mais
e ficares da minha altura
queres buscar que usura
grande só como os tais?»

«Quando for grande quero ser
nada como convém
olhar o vazio com desdém
e seguir só o prazer

Mas se quero ser só e nada
é porque não tenho que querer
a valer, a valer, só o ser
que ao tudo dá entrada

na vida já somos tudo
correr? só se luz nos traça
e quanto a si, minha senhora
não sei mesmo que lhe faça!»
o esquisso é a palavra da eternidade.

amo-te, flor

amo-te flor, por seres quem és
e não por ser eu quem sou
mas como posso eu fazer isso
se és para mim uma sensação obscura
que não conheço e vou sentindo?

amo-te rio, por correres sempre
e não por estares parado
mas só estando parado se nota a corrente
que corre sempre, sempre, sempre
correndo para lado diferente

amo-te assim sem saber porquê
o mundo é apenas mistério aos olhos
desflorando só se nossos folhos
os folhos que vou criando
em mim, com amor

mas se a página amarela ao lado
se a bainha saltar no fio apertado
como posso conhecer ou amar-te
posso apenas achar que vou achar-te
mais que isso é o nada fechado
só sabe quem se sonha, só sabe quem se entrega, o que é sentir sem sossego, o peso da refrega, o gosto do sem ter medo, só sabe quem não sossega, só sabe quem se mata, e se vive e se sente e se entrega, se faz em mil só para ser a outra metade, quem sabe o que sente e que sente o que esconde, quem mostra o que não pretende, quem vive o que pretender não esconde, é o culto sôfrego e ancião, a mistura da vertigem em fulgor, ante o espaço a imensidão em vertigem, o horror, o coração, a mágoa, o riso incontrolado e a expressão amarga, no céu, no inferno, em todo o lado, quando o sentir peso esmaga fica só o ser, e sua canção dolente na tarde calma faz aquecer e fervilhar o coração que se derrama e se desprende como água de canção ardente, arde no corpo e envolve a alma, faz descer o espírito que vem e não acalma, desprende, destroça, desfaz fazendo tudo, ante o mar e sobre o muro, sobe o monte e sob a capa, jaz nela o conteúdo, o peso que sentir esmaga, jaz do fundo até ao fundo, jaz sempre e nunca arrancada a semente que no véu tira a estrada do caminho que não há quem siga, com o vento, e abanando espiga, e trigo, mosto fervente e gelo quebrado, nem esmalte nem dente nem frio apertado, nem ouro, nem prata nem a mais pura platina pode quebrar o ser que ao ser se adivinha, nem a esfinge, nem o pathos, nem a ferida da tormenta resvala a barca dos assaltos, do planeta até aos Altos, só o fim que nunca chega, insanto e possesso, colérico e desfeito, grita alto ao ouvido do peito para se fazer gente presente, pessoa amada, amor ausente, prova dada e amigo que sente, o que esconde revela não atada a luz que imerge na mente, sentir é isto, sentir é nada, é tudo, o que há de diferente, sentir é sentir, sentir é basta, é isso nosso mundo, em que dele somos crente, contra maré e redemoinho, contra papagaio gritante, fica o silêncio, baixinho, soando como toada distante, estorninho ou rouxinol, mas sempre sorrindo ao longe, à nuvem que passa, a correr, ao ar que prende, e que quer agarrar, ao demente e ao normal, ao louco não insano, o ventre baixa e nele nos prende, desce à terra de repente sendo gigante de antanho, e é isso o ser, é essa a cura, o elixir para a doença obscura que ilude alma e crente, sol e lua, é a mais pura partida de diamante, nele e nela caem amante e amada, e dador e dada, mas a verdade é calada, a verdade é errante, não se prende num instante, dói e não dói nada, sente e é viva por instante, passa, não falada, explica não dizendo, foge do que é e do que vai sendo, fica só o presente, o futuro do irreal passado em que crente cria dizendo que mora já ao lado, foge o dente, foge a espada, por todos os vales erguida, sobe cortina, sobre véu, a balaustrada, o pódio, o louro de toga erguida não ensaiada, ferida e sempre curada, a fonte de toda a idade, o amor da vida com o sentimento da verdade não esquecida do início até ao final do tempo que não há nem tem lento nem rápido nem mau nem mais nem perigo nem poder, nem quem sirva nem quem mande, a vida desfila imponente e nunca jamais estanque, fica quieto, fica aqui, fica aquilo que há que ser, fica o que sempre esteve aqui e nunca deixa de viver, por isso canto, e rio, e choro como um perdido, correndo a lágrima como um fio de contas, colar de pérolas de abóbadas douradas e de fiel guardante, guardo o céu e as estradas, os tudos e os nadas, guardo-te a ti neste instante - o mundo é aquilo que sempre fora, a imagem da perfeição que soa, é tudo isto que apregoa, guardo o nada e liberto o restante.

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007

o grande problema do nosso tempo é o falar objectivamente de forma científica acerca de tudo. A sintaxe é apenas uma das muitas parcelas da linguagem, mas o que a sustenta verdadeiramente é a semântica. O signo existe por causa do significado, e não o contrário. Assim, o signo deve vergar-se as vezes que forem necessárias, e das formas que forem necessárias, para que o significado saia sempre imaculado. A regra que interessa é aquela que surge na mente de cada um, e todas as restantes divagações acerca dela não passam disso mesmo: de opiniões. E a verdade não é opinião nenhuma, a verdade é simplesmente aquilo que é e não poderia ser de outro modo.
é mais superior o homem que não faz nada do que o homem que faz tudo. O homem que faz tudo, não tendo nenhuma parte do seu tempo livre, não pode fazer mais nada, mas o homem que não faz nada tem todo o seu tempo livre para poder fazer tudo.
a razão pela qual os currículos escolares são tão extensos é simples: para impedir as pessoas que os estudam de pensar por si próprias. Os estudantes são treinados para serem soldados de uma guerra que já ninguém se lembra como começou, e muito menos porque dura ainda. Acontece que esta guerra que nos andam a querer fazer travar nunca começou, nem tão-pouco terminou, em suma, nunca existiu, a não ser na nossa cabeça. Toda a aprendizagem que treinar jovens para serem soldados está condenada à partida porque os estará preparando para algo que já não há, o mundo já não anda em guerra há muito, e se ainda subsistem alguns parcos resquícios dela, são insignificantes ao ponto de poderem ser ignorados. É tempo de desmobilizar tropas, despir a farda, evitar a bala perdida e o corpo que apodrece para podermos ver o mundo e ser o mundo por inteiro com as roupas que nos são próprias. Chegou ao fim o tempo de sermos soldados de coisa nenhuma, já não há ordens que possamos acatar, e já não há ninguém que nos possa dar ordens. A única ordem que existe é a que nasce e vive na desordem total e única de cada um. E é essa a ordem de que o mundo precisa.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

o que a vida tem de melhor é não pensar.

Epitáfio de Fernando Pessoa

Quando um dia erguerem estes escritos e tentarem decifrar o que neles escrevo, e derem voltas aos recantos da mente para encontrar o significado que neles pus, aí estarei a rir-me dos confins do espaço que não há e do tempo que não existe, e o universo será testemunha reverberante daquilo que fiz e que tão poucos souberam dar devido valor em vida. Deve haver um desejo mesquinho e sádico entre vós que vos faça amar mais quem já morreu do que quem ora vive. É a prova viva de que quem vive e reina realmente na terra dos vivos é morto, cadáver em decomposição sem pira funerária. Pois oiçam, pode ser que na terra dos mortos reinem sempre e apenas os vivos, onde quer que eles estejam, e que vós estejais mortos e enterrados para eles, e eles vos não olhem com mais amor do que aquele que se tem pela formiga que não pensa, ou pela mosca que não fala. O ataúde dos mortos é o seu esquecimento, a verdadeira existência é a coroa dos que realmente vivem.
eu poderia pensar apenas, mas escrever para mim é viver.

terça-feira, 20 de fevereiro de 2007

um dos problemas da educação, ou, melhor dizendo, da aprendizagem, é o facto de os estudantes recorrerem de forma sistemática à aquisição de conhecimentos (memorização) por repetição reiterada de informação.

podemos distinguir, pelo menos, duas formas de aquisição de conhecimentos. A vigente, e que é extremamente incutida desde tenra idade pela desordenação do sistema de ensino que vigora, é a repetição simples de informação. Esta repetição cumpre a sua função de memorização, isto é, de aquisição de informação, em termos bioquímicos, por estabelecimento de projecções dendríticas entre células nervosas e transmissão de sinal electromagnético associado, sendo este mediado por moléculas neurotransmissoras. A reiterada repetição simples leva ao estabelecimento de um circuito neuronal específico, no qual a transmissão de sinal tem cada vez mais facilidade em ser efectuada entre células, o que leva à especialização dessa porção neural no armazenamento da informação que é continuamente repetida. Caso a repetição da informação cesse, e surja uma outra, então o circuito neural que foi estabelecido deixa de executar uma função útil ao organismo, e portanto enfraquece a passagem de sinal por ele. Numa situação limite, existe a reorganização desse circuito de tal forma que se torna mais difícil o seu futuro estabelecimento, e portanto enfraquece a reactivação da memória armazenada até que esta desapareça por completo. A cessação da estimulação por repetição leva à degeneração da informação.

por outro lado, a memorização pode dar-se por estabelecimento de redes de associação conceptual de informação. Neste caso, uma dada informação é memorizada por estimulação através da repetição, é certo, mas, contrariamente ao primeiro caso, a estimulação é emparelhada com outra informação que já tenha sido memorizada. Esta ligação conceptual cria autênticas redes de informação neuronal, e potencia a sua reactivação, já que, estando duas informações associadas ou ligadas entre si, a reactivação de uma potencia a reactivação da outra, visto que o encadeamento mnésico é semelhante: as informações sucedem-se de forma lógica por se encontrarem ligadas e a isso corresponderá possivelmente a conjuntos semelhantes ou próximos fisicamente, ou até partilhados, de redes neuronais. Quanto maior for o grau de emparelhamento ou de conexão estabelecida entre as informações que se memorizam, então a probabilidade de reactivação de uma destas informações é maior do que no caso em que a memorização foi conseguida por apenas simples repetição da informação. E mais, a probabilidade de reactivação de uma informação conectada, emparelhada ou próxima de outra informação que já sofreu reactivação é maior, o que leva a um desenvolvimento ainda maior da memória individual, por uma cadeia de reactivações sucessivas - aspecto fundamental num pensamento divergente, criativo, original ou numa equacionação de diversas variáveis subordinadas a um mesmo problema.

portanto, o que existe, sim, é um profundo desconhecimento acerca de neurobiologia e psicologia, para não falar de pedagogia, ou uma falha incrivelmente grande na sua aplicabilidade prática.
um dos meios pelos quais se faz o triunfo do socialismo e a mediatização dos acontecimentos pessoais e únicos é a sua naturalmente consequente prostituição.

Pode não se sentir vergonha enquanto se evacua e se copula mas é muito provável que se sinta vergonha quando essas gravações forem retransmitidas a um público reprovador.
William Burroughs, em Feedback de Watergate para o Jardim do Éden

mas o importante está em compreender qual o processo que faz com que algo com uma valoração positiva, isto é, um determinado signo com um significado positivo para uma pessoa se pode tornar em algo com um significado negativo.

no estado natural, uma determinada informação que uma e uma só determinada pessoa possui é algo precioso, isto é, esta informação é rara porque é apenas presente numa só pessoa. Como rara, é valiosa, porque não existe mais nenhuma informação igual a ela, torna-se uma única na sua espécie, e portanto é a fundação de um princípio de originalidade pessoal, de sentido de único, e de próprio. Muitas vezes essa informação é algo directamente relacionado com a pessoa que dela tem conhecimento, por vezes é até a própria pessoa. Esse factor contribui em muito para valorar ainda mais algo que se tinha em tão alta estima. Valoração positiva, portanto. O que é raro é valioso.

se essa informação for contada a uma outra pessoa, então a informação deixa de ser pessoal e única, e passa a tornar-se, em menor ou maior grau, cada vez mais pública. Assim, de uma pessoa passamos a duas, e aí já a informação estará mais dispersa. Mas há um perigo que temos que ter em conta. É que o mesmo signo pode ter, para pessoas diferentes, diferentes significações. Assim, dependendo das experiências pessoais, o signficado da informação pode tornar-se positivo ou negativo. Se continuamos a propor o modelo simples de evolução em progressão geométrica no qual cada pessoa transmite a uma outra essa informação, então temos que a probabilidade de haver mudança na valoração, isto é, no significado da informação é progressivamente maior.

esta situação poderá tornar-se limite quando a rede de significações das pessoas que recebem a informação a posteriori é muito diferente da rede de significações da pessoa que tinha inicialmente a informação. Eis como uma informação com um determinado significado pode vê-lo alterado pelo contacto com outras redes significantes.

o importante aqui será o peso que tem cada rede significante. Se é mantido tanto o significado original da pessoa de onde nasceu a informação, se ele não é deturpado, mitigado, alterado ou escondido, e se permanece o mesmo, então a probabilidade de compreensão da informação como ela era originalmente compreendida, ou como fora originalmente concebida, é muito maior.

mas temos que atentar noutro aspecto, também importante, que é a própria característica do fenómeno perceptivo que leva a conhecer essa informação. Se uma pessoa cega toma conhecimento de uma representação pictórica que nasceu na cabeça de outra pessoa, não vai poder compreendê-la senão por meio de palavras, e não por meios de desenhos. Assim, cria-se aqui o perigo de introduzir um elemento subjectivo na intenção objectiva de transmitir o mais fielmente possível a informação visada. A pessoa cega não pode senão ter um conhecimento, isto é, não pode senão percepcionar a informação de uma forma deturpada.

mas podemos imaginar outra situação: o homem que, não sendo cego, é, porém, daltónico. É certo que aqui a mensagem, a representação pictórica, será mais fielmente traduzida, mas, se esta for colorida, algumas das cores podem não ser percepcionadas correctamente pelo indivíduo, levando à deturpação, ainda que de grau menor em comparação com a anterior, da informação transmitida.

portanto, podemos concluir que são vários os graus de cegueira humana que a impedem de ver claramente a mensagem, isto é, a informação que é transmitida. Uns não se podem reduzir a outros, já que uns levam a uma deturpação de maior grau que outros.

e se pularmos do domínio da representação da imagem, da informação, física, para o domínio da valoração ou da semântica da informação, então aí crescem logo novas e mais perigosas dificuldades à sua transmissão porque o domínio da semântica é o domínio das ideias, isto é, das significações não físicas de uma informação e que lhes servem de base, justificando o uso de determinada linguagem - imagens, palavras, sons,...

quando a informação inicialmente é genuinamente única e exclusiva da pessoa de onde nasce, então a correspondência original e pura entre signo e significado é assegurada inequivocamente. A partir do momento em que a informação é transmitida, então esse equilíbrio, se não for mantido, pode fazer virar uma roleta de significações, levando à deturpação da mensagem ou informação inicial.

e há um fenómeno interessante, que é o facto de as pessoas considerarem como sua a informação que lhes é transmitida, independentemente da sua fidedignidade. Essa apropriação resulta de uma identificação com a informação, mesmo se apenas a parcela do signo é a mais ou única visada deste binómio. Mas se, de facto, existe maior dispersão de informação, isto é, se o grau de entropia da informação aumenta, também é possível constatar que ocorre uma consequente despersonalização da informação original, que passa a ser vestida, isto é, passível de alteração pelas pessoas às quais ela foi transmitida. O carácter de unicidade, de importância, de raridade e preciosidade dessa informação desaparece, e ela torna-se banal, isto é, deixa de ter o seu valor, o seu significado perde-se porque não é algo que necessite de ser preservado, já que está presente em todas as pessoas, ou pelo menos numa grande parcela destas.

esta preocupante consequência é espelhada de forma clamorosa na concepção socialista que está hoje vigente. O nível de entropia da informação é hoje tão alto como nunca antes foi, e conduz a situações limite de globalização, isto é, consumo em massa da mesma informação, a banalização em massa da mesma e a sua despersonalização, a invenção da moda, que é algo que se altera constantemente devido a essa mesma despersonalização resultante do consumo em massa. O problema que atravessamos nesta viragem de século está na demasiada dispersão da informação que evolui até à desvalorização, isto é, à perda de sentido, de significado, seja ele bom ou mau, elementos que estão presentes na cultura do descartável, na noção light, no soçobrar de noções fundamentais como a vida quanto ao nascimento da cibernética, a tendência capitalista e capitalizante da economia, a valorização da sociedade em detrimento do indivíduo, o culto da democracia como elemento massificante, etc.

o problema reside exactamente nesse binómio signo - significado. Com a emergência de novos e mais rápidos meios de transmissão de comunicação e transporte é possível transmitir muitos mais signos do que fora antes possível. O problema é que nesse transporte em massa de signos, os significados, que são a verdadeira fundação dos signos, e a sua causa, são descurados, o que contribui em muito para a sua desagregação, a sua tendência dissolvente ou desagregante. Isso não quer dizer que eles não existem; eles existem ainda, pois é com base neles que existem os signos, pois todo o signo existe para significar algo, caso contrário não teria função nenhuma e deixaria progressivamente de existir, dado o seu carácter obsoleto. O que acontece é que os significados são desagregados à força, isto é, dado o nível de entropia vigente. Para que não cheguemos a uma situação extrema, em que os significados se tornem raros e o próprio propósito da linguagem se vá esvaindo, tem de ser mantido um estado neguentrópico que conserve os significados. Isto é, a nível de sintaxe, as palavras e os demais signos devem ser dispersados, de modo a que as pessoas possam ter livre acesso a eles. Por outro lado, a nível semântico, os significados devem ser cuidadosamente demarcados e associados aos signos, para que possa existir uma verdadeira comunicação, uma transmissão de uma mensagem, ou informação significante. Isso só é possível pela dispersão controlada de significados, isto é, pela restrição de determinados tipos de informação a todos, e sua abertura a apenas alguns, aqueles que são capazes de compreender por inteiro a relação signo - significado.

a democracia está, neste quadro, naturalmente votada à dissolução, pois cumpre apenas a função dispersante da informação, e não a sua função conservante. É necessário reacender a chama do republicanismo, isto é, da res pública, a coisa pública, porque a coisa é tudo menos pública hoje em dia. É preciso aumentar a dispersão de signos o suficiente para que essa coisa se torne realmente pública, que todos possam aceder a ela, mas, isto é, por outro lado, é preciso garantir igualmente que as mensagens ou informações de grande significação são cuidadosamente mantidas para que essa significação não se perca, e isso só é possível se essa conservação for levada a cabo por uma autêntica aristocracia, isto é, por uma centralização em pequenos grupos que têm como função manter essa ordem binomial correspondente, a do signo-significado. É neste quadro que a proposta do Doutor Agostinho da Silva tem toda a relevância, visto que a Monarquia Republicana, como ele próprio a designava, tem na sua constituição todos os elementos necessários a esta empresa entrópica e, ao mesmo tempo, neguentrópica. E Portugal tem aí um papel bastante importante, já que, como Nação, já passou por um período da história em que esse regime vigorava, e talvez não seja ingénuo supor que talvez um regime como esse fosse capaz de ir para a frente, se já o fez antes e com frutos tão grandes e importantes, não só para Portugal como para todo o Mundo.

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2007

aquilo que mais gosto de fazer é absoluta e rigorosamente nada - e quem sabe o que isso quer dizer...
quando penso em fazer algo, ler um livro, por exemplo, e começo a ver a quantidade de livros que já foram escritos e que gostava de ler, e os livros que tenho para ler, e os livros que já li mas que gostava de voltar a ler, só posso sentir o esmagador peso absurdo da megalomania desajustada. Que me interessa que se publiquem mil livros todos os dias? A vida traz até mim os livros que devo ler, porque nem tudo o que se diz ou pensa se deve escrever, e nem tudo o que se escreve se deve ler.
as pessoas esqueceram-se de Piaget. Aprender é uma construção pessoal e única, e depende não só do código genético, nem só do ambiente físico e da educação, mas sim, e muito, do indivíduo, a pessoa que conhece. Sem ela não existe aprendizagem. Sem ela, a aprendizagem é nada.

poesia

para mim, a poesia é uma coisa escrita em letras que não é as próprias letras, mas outra coisa de que ninguém sabe o nome.

só há uma maneira de ler poesia: é lê-la no momento em que se quer ler, e não como se de um romance se tratasse, porque não há na poesia nenhuma lógica da prosa, só há a lógica, se é que ela existe, da sensação.

a maneira de guardar poesia é dispô-la em estante nenhuma, mas antes deixá-la espalhada pela casa, pelo chão, pelas paredes, e às vezes pelo tecto, às vezes até no espaço que não existe, e no tempo que não há, para que seja ela a vir ter connosco, e para sabermos que é ela que vem ter connosco quando nós mais precisamos, e não o contrário.
Toda obra fala por si, com a voz que lhe é própria, e naquela linguagem em que é pensada; quem não entende, não pode entender, e não há pois que explicar-lhe. É como fazer compreender a alguém, espaçando as palavras no dizer, um idioma que nunca aprendeu.

Ricardo Reis, prefácio à poesia de Alberto Caeiro
realmente é bastante interessante esta nova tendência que é fundir o velho com o novo, porque acaba-se tendo algo original, que não esquecendo o passado está com certeza voltado para o presente. As agradáveis fusões do Jamie Cullum a misturar rock e pop com jazz, da Norah Jones a misturar jazz com pop, do próprio bossanova brasileiro, do Mika com o rock e o pop, ou do Freddie Mercury e a grande Montserrat Caballé a fundirem canto lírico com rock/pop são prova disso, e está-se a caminhar para uma situação em que já não se sabe dizer o que é o quê, apenas que a própria essência musical se faz do que ditar a originalidade de cada um, que pode ser igual a tudo e diferente de tudo ao mesmo tempo, sem contudo deixar de ser essa mesma originalidade única que sempre se renova e reinventa.
talvez esses heterónimos que Pessoa foi e é hoje pelo mundo inteiro fossem apenas uma invenção sua, um seu fingimento, para que pudesse falar de todas as maneiras que os homens entendem, e assim poder chegar a todos eles, sejam os amantes da natureza real, isto é, os que amam as ervas, os montes, os vales, a lua e o sol, as estrelas e os campos, seja com os engenheiros e mecânicos de odes triunfais e movimentos cibernéticos, seja com os clássicos gregos e romanos, pagãos por natureza e amantes do culto estético aos deuses, seja dos que vivem atormentados com o peso que é sentir e pensar, seja com os que falam apenas o inglês comercial, mas que também é perceptível à sua consciência, seja como e com quem for, ser um poema universal.

Dicionário Enciclopédico Patafísico II

já viram que a palavra reparar
vem do latim reparare
que nos leva a
parar
a
parar
e
a
parar
repetidas vezes
até à repetição re-
parar
já repararam como a lua
é branca e redonda, e leitosa
e na sua cama de estrelas diz tudo
mesmo se não precisa de dizer nada
porque não tem bocas como os homens?
que tem ouvidos e olhos
onde os outros só têm bocas?
e que cheira o escuro e a claridade
que vem não se sabe de onde
e dá luz às nossas noites?

dedicado a Mestre Caeiro
não há nada pior que tirar o sono meditante que une o eremita ao seu sonho.
dêem-me um martelo
um martelo de pedra e aço
para despedaçar flamejante
toda a inútil existência
do que ir existindo é senhor
e não sonho

domingo, 18 de fevereiro de 2007

Dicionário Enciclopédico Patafísico I

há expressões verdadeiramente deliciosas, como a redondezas - o que está à volta, em orla redonda, como as curvas de uma mulher, subtis, convidativas, lascivas e terrivelmente sensuais, e doces. O que está no raio, dentro do círculo, o que não se exclui equidistante do centro, o que a vista abarca ou alcança, o raio daquilo que conhecemos, a realidade curva para lá da qual só existe desconhecido. A inexistência de vértices num tal polígono dá-lhe uma forma extremamente regular, e misteriosa, apetecível, faz desejar o não desejado, sem cantos, pleno de encantos.
queime-se toda a poesia que é prosa e descrição científica de emoções. A poesia é mensagem, não é uma prosa mal-amanhada.
Não sou teu nem de ninguém
Esqueci-me ao que vim
Quem sabe por onde andei
O que vi, o que perdi
Quantas vezes me encontrei
Quem sabe quanto senti
Quem sabe que vi e calei
Não sei por onde andei
Só sei que estou aqui
Agora e aqui, sim
E que sempre estarei
a televisão é o ópio do povo.
a televisão é a pior droga do século XX.
hoje em dia não existe publicidade, só agressividade. A violência com que somos confrontados com os mais diversos produtos e com um desejo consumista horrendo é nojenta. A publicidade é que é o verdadeiro vírus, e não a linguagem, como dizia William Burroughs. A linguagem é desejo, vontade, de comunicar. A publicidade é querer à viva força tornar a pessoa, plena de individualidade e imprevisibilidade, numa máquina de consumo previsível, frenético e imparável, para satisfazer as vontades capitalistas e a assimetria económica de ricos e pobres. Por isso devemos todos dizer NÃO à violência, seja a das ruas, a das palavras, ou a das imagens, e sobretudo a da publicidade que consome, para além dos intervalos entre programas televisivos ou páginas de jornal ou da internet, o nosso cérebro e nos impede de expressarmos o que realmente somos.

sábado, 17 de fevereiro de 2007

o tempo de Pessoa já passou
o que agora há é difundir e dispersar
o que guardava e que não soou
é tempo agora de alcançar

o tempo agora já não é certo
já nem sabe do que fala assim sendo
o tempo é bala, ou electrão, ou incerto
já não há quem os filhos vá comendo

o tempo muda, e o tempo de calar
já passou, já foi, já fora, não tem nada
que enganar, neste som que ora soa
soa agora o que há que soar

o tempo de Pessoa está prestes a acabar
toda a vida é um símbolo
os verdadeiros génios são os que não se impõem. São, simplesmente. E todos lhes reconhecem o seu pleno direito de ser.
a cada passo que dou o desconhecido desfila sob meu olhar. Pensá-lo? Segui-lo apenas. Como a criança que segura mão para atravessar a estrada, não penso. Sinto. Sinto que há estrada sem olhá-la, mas vendo-a de sobremaneira, em todo o lado, à minha volta. Quem me segue não conheço. Uma a sombra, a outra a silhueta desse inominável em que me perco. Perder-me nele é andar pela rua, não como quem atravessa uma estrada, mas como quem caminha pela terra. Com o pé na chuva, e no pó da estrada. Quem me guia, me leva. Para onde não sei. Quem sabe? Que interessa? Quem me guia sabe, isso basta. Como para ter qualquer certeza.
Pessoa não pensava, escrevia.
Se me disserem que é absurdo falar assim de quem nunca existiu, respondo que também não tenho provas de que Lisboa tenha alguma vez existido, ou eu que escrevo, ou qualquer cousa onde quer que seja.

Fernando Pessoa

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

o linfócito burocrático, estático, para que possa ser activado, isto é, para que possa mostrar o seu potencial genético, o seu valor estético, necessita de um sinal primeiro de uma célula dançante e apresentadora, naturalmente estimuladora, para que o herói se possa cumprir inteiro.

mas só o sinal primeiro não dura, é preciso algo mais por aí, uma estimulação mais segura, aquela que num sonho co-estimulador traz doçura e sabor acre de interacção segunda - vem esta da célula dançante, também, nascendo do amado e da amante que numa interacção ferrante consagram sua coroa

e eis que o mundo se transforma, o linfócito vive, já não soçobra, e ganhando nas asas a imaginação de outrora, vai fulgurante para o céu, que é seu destino e lugar onde mora

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

ver telejornais é uma pura perda de tempo. Toda a gente sabe que o mundo está no estado em que está, que está mal e vai mal, e ainda pode vir pior - faz então sentido repetir algo óbvio até à exaustão?
criticar sem apresentar soluções é como cantar de boca fechada.
quando Marx afirma que existe uma luta de classes, está a pressupor duas coisas: a primeira, de que existem classes, e a segunda, de que existe uma luta. Quanto à primeira, parece-me que estava certo. É certo que existem classes diversas, mas há algo que ele não reparou, e que é o erro de todo o socialismo, é que existem tantas classes como pessoas. Todas as pessoas são diferentes e únicas. Um agregado sociológico é apenas uma expressão metafórica, não tem qualquer existência real. O que existe é um conjunto de pessoas, todas diferentes entre si, e algumas podem exercer determinada influência sobre outras, mas isso não significa que todo o conjunto reme para o mesmo lado. Aliás, é mais a excepção que a regra, e ainda bem que é assim, porque é por causa disso que evoluímos.

Quanto à segunda, parece-me que estava errado. Se é certo que cada pessoa é única em si, não me parece que todos lutemos uns contra os outros. Competir, quanto muito, lá competem os animais, e as plantas, por nutrientes e para se desenvolverem. Agora, quando falamos do homem, não falamos de luta certamente, porque senão já nos tínhamos matado todos uns aos outros. O erro de assumir que toda a gente luta maquinalmente pela sobrevivência é um erro crasso, porque é assumir que toda a gente luta. Primeiro, nem toda a gente tem que assegurar a sua sobrevivência, e vive já confortavelmente bem. Segundo, não se trata de uma luta por poder, trata-se simplesmente de uma expressão do seu potencial individual. Se existe luta, em alguns casos, a sua causa não está na existência de classes, mas no desejo de ter aquilo que se não tem. E o desejo não é motivado por nenhuma classe, apenas por um sentimento de cobiça interior. Se uma classe é desejada é porque os membros dessa classe possuem algo que alguém cobiça. Portanto, o mal não está nos membros da classe cobiçada, o mal está é em quem cobiça. A cobiça nasce desse desejo. E esse desejo nasce da mensagem subliminar que certas pessoas transmitem de que a felicidade está em possuir determinado tipo de coisas. Portanto, o desejo nasce de um sentimento consumista que é alimentado por capitalistas que querem vender o seu produto e obter o maior lucro possível. O Capitalismo é algo bom quando consideramos a sua dimensão de desenvolvimento tecnológico, permite competitividade, é capaz de fornecer uma grande quantidade de bens a um grande número de pessoas, faz veicular muita informação em pouco tempo. Porém, também torna tudo muito mais efémero, ritmado ao toque do relógio, e enredado sobre si mesmo num ciclo que se vicia continuamente. O mal está na definição de felicidade que alguns querem fazer passar, e que outros, por pouca perspicácia ou insuficiente educação, engolem sem protestar.

Assim, o que há a fazer é mudar o que está mal de raiz, que é a própria ideia de que a felicidade deve ser uma coisa nomeável, e não algo que possa ser construído pelas mãos de cada um, segundo a sua própria individualidade. E isso só é possível pela educação, para que cada um possa, por si próprio, por um lado, saber pensar, e, por outro lado, saber fazer.
seria muito mais saudável para todos se os médicos se apercebessem de que a Medicina é apenas mais um ramo da Biologia.
os momentos de lucidez cósmica são todos os momentos em que nos lembramos de que também nós somos o universo.
Processo gnosiológico do mundo

1 - Primeiro, há que começar com uma base de estudo. Assumindo que os nossos sentidos nos fornecem algum tipo de conhecimento, ainda que este possa ser imperfeito, parte-se dos sentidos tácteis, olfativos, gustativos, auditivos e visuais.

2 - À falta de garantia da existência real do que quer que seja, assume-se uma realidade menos imperfeita das sensações que podemos ter de objectos físicos. O primeiro sentido a priveligiar deve ser o do tacto, visto que com ele nos apercebemos da existência volumosa e agregada de algo, o que nos pode servir como termo classificativo de algo que existe.

3 - Depois de avaliados os objectos com o tacto apenas, devemos partir para a utilização da visão. Dado que a visão nos possibilita a percepção de que existem objectos físicos exteriores e interiores a nós, podemos assumir que tomamos contacto com a realidade mais real possível.

4 - Os restantes sentidos devem ser preteridos porque não garantem a substância física de coisa nenhuma, apenas provocam em nós sensações. Assim, o olfacto, o paladar e a audição devem apenas ser considerados por aqueles que se ocupam do estudo das sensações internas humanas.

5 - Com o tacto e a visão é possível percepcionar diferentes objectos exteriores a nós, com características próprias.

6 - A compreensão do mundo físico, contendo todos os seus objectos, em suma, a análise da natureza, é demasiado complexa para ser efectuada de uma vez apenas.

7 - Assim, é necessário visualizar o mundo físico como um conjunto de objectos individuais e diferentes que, quando somados, são equivalentes ao todo.

8 - A verdadeira análise pode então começar: os objectos individuais são suficientemente menos complexos que o todo para que possam ser estudados em toda a sua extensão.

9 - Mas alguns desses objectos permanecem ainda inacessivelmente complexos para a compreensão humana. Assim, devem ser, eles próprios, decompostos em partes, assumindo que a sua soma reconstituirá o objecto primordial.

10 - As nossas capacidades perceptivas, embora bastante úteis para proceder a estas primeiras fases do processo gnosiológico, revelam-se inúteis para conhecer as partes que constituem os objectos. Assim, é necessário divisar objectos, instrumentos, que permitam ampliar as capacidades tácteis ou visuais. Dado que as tácteis se encontram muito menos desenvolvidas em nós que as visuais, devem ser preferidas estas últimas.

11 - Mas até aqui não foi feita senão uma análise bastante grosseira do físico. A partir deste momento, podem tomar-se duas abordagens distintas.

12 - Por um lado, pode escolher-se analisar o objecto ou a sua parte constituinte de forma não invasiva, isto é, não modificando a sua própria natureza, ou não fazendo uso de estímulo. Procede-se à análise descritiva de todas as características que nos for possível determinar, e repete-se o mesmo processo a todos os restantes objectos. Depois de recolhida toda essa informação, ela é cruzada e procuram-se níveis de ocorrência em simultâneo de diversos objectos, o que permite postular que existe ou não uma correlação entre eles. A natureza dessa correlação não pode ser senão vaga, e não permite extrair com fidelidade uma conclusão verdadeira.

13 - Por outro lado, pode também analisar-se um objecto exercendo um estímulo sobre ele, e verificando qual a sua resposta face a esse mesmo estímulo. Assumindo uma relação de causa-efeito na ligação estímulo/resposta, então é possível traçar propriedades características dos corpos ou de partes que os constituam, podendo até mesmo ser confirmadas ou negadas correlações estabelecidas de modo não intrusivo.

14 - Esta tarefa é, ela própria, por si só, muito audaciosa, tal é a quantidade de objectos que compõe o mundo e a quantidade de partes que compõem os objectos.

15 - A análise deve ser seguida até ao ponto em que não é possível analisar, por decomposição, objectos ou partes.

16 - Depois dos estudos de causa/efeito efectuados, é preciso confirmar a validade ou não dos pressupostos utilizados como base do seu fundamento.

17 - Porém, actualmente, esses mesmo estudos mostram que não existe substância real, isto é, permanência, quer dos objectos físicos, quer das suas partes. Os objectos físicos caminham para a sua desagregação inexorável.

18 - Assim, não podemos confiar na realidade do mundo físico, dado que este é, por sua característica intrínseca, não permanente e desagregante. É então necessário procurar algo que possua uma substância real, isto é, algo que não se desagregue.

19 - Mas algo interessante que ressalta desses mesmos estudos ao físico é o facto de que as leis postuladas através do estudo dos objectos ou das partes que os constituem se verificarem permanentemente, independentemente da existência dos objectos físicos.

20 - Por outro lado, também é verdade que essas leis apenas se aplicam a objectos físicos, concretos, individuais. Para conhecer quais as características do mundo em que vivemos é necessário encontrar as leis que, independentemente de qualquer contexto, isto é, que independentemente de qualquer objecto ou parte deste se verificam.

21 - Assim, o próximo passo será a reunião de todas as leis elaboradas com base dos objectos físicos e a sua depuração, até que restem apenas as leis que, possuindo nenhuma excepção, podem ser consideradas como características do mundo, isto é, permanentes.
aquilo que Leonardo Da Vinci fez quando procurou conhecer o mundo é algo muito interessante, e um óptimo caminho para conhecer. Partindo da natureza, isto é, tendo como ponto de começo a análise das partes que compõem a natureza, procura-se chegar às leis pelas quais o nosso mundo vive. Mas, por outro lado, também temos que dar razão aos psicólogos da gestalt, visto que o que percepcionamos não é apenas uma soma de partes coladas com fita-cola, mas antes um todo organizado, que é uma dimensão que supera toda a soma ou qualquer uma das partes individuais. Então o melhor que haveria a fazer era juntar estas duas perspectivas: começar pela apreensão do geral, visualizá-lo bem e senti-lo, e depois então partir para a análise, para a particularização, para a decomposição física, até que não se possa mais decompor. Aí, uma vez analisado o fragmento, juntar os pedaços a pouco e pouco, e tentar ver que interacções se estabelecem entre uns e outros. Mas quando o número de pedaços juntos for já suficientemente grande, e impossível a nossa capacidade de discernir qual é causa e qual é efeito, voltamos de novo para o todo, e é no todo que vão sobressaindo as características que observámos nas partes, umas mais à direita, outras mais à esquerda do que prevíramos, é certo, mas anda lá um sopro delas, que é colhido por essa coisa que ninguém sabe, nem sequer dizer por palavra, essa coisa que é um grande mistério e que a todos nos deixa sem palavras. O que é lei? O que há de permanente. O que é efémero? Tudo o resto.

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

às vezes fecho os olhos para imaginar, é mais fácil notar a luz na escuridão completa.
a imaginação é uma casa sem paredes cuja porta de entrada deixou de existir por tanto se esquecer da chave que abria uma fechadura que nunca houve.

(uma vez aberta a porta da imaginação, o difícil é fechá-la.)
uma verdadeira obra de arte, finalista de um concurso lançado pelos Incubus, que surgiu da fértil imaginação lusa do anónimo Carlos Oliveira. O mundo está mais rico com a expressão da tua imaginação!


Incubus

Dig
e para mostrar que sempre se fazem coisas interessantes e significantes pelos lados do pop...


Mika
Grace Kelly

Do I attract you?
Do I repulse you with my queasy smile?
Am I too dirty?
Am I too flirty?
Do I like what you like?

I could be wholesome
I could be loathsome
I guess I'm a little bit shy
Why dont you like me?
Why dont you like me without making me try?

I try to be like Grace Kelly
But all her looks were too sad
So I try a little Freddie
I've gone identity mad!

I could be brown
I could be blue
I could be violet sky
I could be hurtful
I could be purple
I could be anything you like
Gotta be green
Gotta be mean
Gotta be everything more
Why dont you like me?
Why dont you like me?
Why dont you walk out the door!

How can I help it
How can I help it
How can I help what you think?
Hello my baby
Hello my baby
Putting my life on the brink
Why dont yo like me
Why dont you like me
Why dont you like yourself?
Should I bend over?
Should I look older just to be put on the shelf?

I try to be like Grace Kelly
But all her looks were too sad
So I try a little Freddie
I've gone identity mad!

I could be brown
I could be blue
I could be violet sky
I could be hurtful
I could be purple
I could be anything you like
Gotta be green
Gotta be mean
Gotta be everything more
Why dont you like me?
Why dont you like me?
Why dont you walk out the door!

Say what you want to satisfy yourself
But you only want what everybody else says you should want


I could be brown
I could be blue
I could be violet sky
I could be hurtful
I could be purple
I could be anything you like
Gotta be green
Gotta be mean
Gotta be everything more
Why dont you like me?
Why dont you like me?
Why dont you walk out the door!


mais uma razão, para quem ainda não está convencido
não me parece que a massificação generalizada dos meios de comunicação seja algo extremamente positivo. Na verdade, os meios de comunicação são a próxima forma de ditadura: agora já não é preciso ter alguém cá fora, real, e físico, basta um princípio, um ideal, mesmo que não se saiba o que é, o que é preciso é apenas mostrar a total e independente obediência absoluta a uma causa inexistente. Os telejornais actuais apressam-se de todas as formas e feitios, por todos os mecanismos possíveis, a esmagar a nossa total afirmação como seres humanos, mostrando que o mundo é apenas um poço sem fundo de desgraça, de guerra, de acusações e acontecimentos contestatários, catástrofes naturais, em suma, de uma luta pela sobrevivência, como diria Darwin, ou de uma luta de classes, como diria Marx. O nosso belo e amorfo socialismo, tanto desflorado na ciência como na política. Talvez o próximo passo seja a afirmação da individualidade pessoal e intrínseca, minha e nossa, de todos, e a abolição de qualquer tipo de regra imposta de fora para dentro.

Marx tem, de facto, algumas semelhanças interessantes com Darwin. Mas não me parece que toda a vida se baseie apenas numa luta pela sobrevivência, ou pela sobrevivência do mais forte. Que existe evolução, isso tanto o registo fóssil como a história o mostram, mas os pormenores, o passo, a influência dos diversos factores, esse andamento, ou compasso, evolutivo é que nós ainda mal conseguimos perceber. O problema está numa visão fechada e centrada em apenas alguns aspectos do mundo, o que é preciso é que se juntem uns aos outros para se ver o que é que a coisa dá. As classes existem, e vão continuar a existir, mas não em conjunto; as classes existem dentro de cada indivíduo, porque cada um é único em si e perante todos os outros. E nem tudo se baseia numa luta frenética pela sobrevivência, porque os seres vivos, os organismos, não são entidades isoladas umas das outras, pelo contrário, convivem em conjunto, e interrelacionam-se mutuamente, e de formas tão complexas que nos é difícil, ou pelo menos por enquanto, ter noção global. A Ciência do amanhã é a Evolução, não a Darwiniana, mas a Ecológica e Genética.

A Genética permite compreender como se dá a evolução individual dos seres vivos ao meio e a outros seres vivos, a adaptação por expressão do seu programa genético. A Ecologia permite compreender como se dá a evolução conjunta entre os seres vivos e o meio, a adaptação por mudança de expressão consoante o nível em que está o mundo. Junte-se as duas, e teremos uma nova Ciência, a Ciência do Amanhã.
porque não fazer um boicote à capitalização de feriados e efemérides comemorativas? Neste momento, o Natal, o Dia dos Namorados, a Páscoa, e tantos outros, são mais uma propaganda publicitária massiva e uma mensagem subliminar capitalista. Assistimos impávidos e serenos à concreta materialização daquilo que pode e daquilo que não pode ser materializado, e somos parte integrante desse sistema do efémero, a dança das modas, que está naturalmente, por inexistência substancial aguda, votado ao esquecimento. Faz lembrar a atitude de Gandhi perante a imposição dos produtos ingleses à Índia: começar a tecer a sua própria roupa. E que bela ideia esta - fazer com as nossas próprias mãos o que nós queremos ser, procurar em nós o material, físico ou metafísico, para construir a nossa casa, para tecer a nossa alma, para mostrar ao mundo que toda a roupa que cada um faz é diferente e original, e que não pode ser comparada com nenhuma outra, porque não existe nenhum referencial ou termo comparativo. São as grandes coisas que nos unem, e a constatação da avassaladora unicidade que reside em cada um de nós é algo tão grande como o próprio universo.
a atestar a assimetria tão característica de Portugal está a quantidade de expressões airosas que se utilizam para descrever uma situação, um paradigma ou um fenómeno que pouco ou nada têm que ver com aquilo que elegem para objecto da sua representação. Dizer que existem candidatos a estudantes de medicina nota 10 é tão irreal que nem se me ocorre termo comparativo adequado. Se existem pessoas que querem estudar medicina e que vão para outros sítios - Espanha, República Checa, ... - é, muitas vezes, porque lhes faltou a tal centésima, ou a décima, para poder fazer frente às exigências burguesas de uma classe que se considera intelectualmente superior que as outras. Ou, para ser mais directo, dizia que na minha terra isso se chama um insulto, na melhor das hipóteses.

claro que o estado em que os numerus clausus estão contribui ainda mais para cavar um abismo sepulcral entre profissionais (ou pseudoprofissionais) de diversas áreas, que ganhariam muito mais em ter um discurso integrado e integrante.

terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

a blogosfera deve ser, actualmente, o local onde mais e melhor se cria.
não tenho trabalho, só prazer.

Abre-se o vazio e na escuridão uma luz

A luz cega o crente como num clarão e seduz

Na esperança de encontrar o que não há dito vai

E uma luz capta no seu ai a confissão de um instante que se esvai

E seduz

Rasga o clarão o negro da escuridão que envolve e que tropeça

Que soçobra e que cai

Rasga o humor aquoso dos dias cinzentos e transforma a peça numa equação que vai

Não existe, mas resiste

Afaga o brilho baço e triste do pudor que envolve com dedos nus a sua afirmação

Não sabe, nem diz

Mas continua a rasgar com voz de trovão, a matar

A soçobrar e o clarão vem de novo para aconchegar

E no limiar do beijo, numa candura incessante

Num movimento disforme ou inconstante, lança ao abismo o ar

Que só o sentir percebe o que o mundo no momento tem para dar

Consegue

E seduz

Num clarão que traz a luz

sabor a mar

Em qualquer aventura,
O que importa é partir, não é chegar.


Miguel Torga
o anonimato é o melhor remédio para a grandeza porque é no silêncio que se cria.
quando penso no futuro que virá no final dos tempos, perco-me no absurdo.
depois vejo melhor e reparo que o futuro só existe na nossa cabeça.
talvez tenha o português em si tanto que não consegue lidar com isso, e portanto daí a frequente incapacidade de se pôr em prática aquilo que se quer. Mas se o problema é lidar com o que existe, e com o que se é, há certamente quem o consiga fazer, tanto mais porque é a nossa cultura riquíssima, para onde quer que olhemos. Se o português se enfastia deverá ser porque sabe que já o D. Afonso Henriques e o D. Dinis tinham feito isso, ou se o não fizeram, o pensaram. Para quem vê tudo como um todo, será naturalmente difícil nomear o inominável ou explicar o incompreensível. Mas quando se trata de fazer, aí, o português faz. E tanto mais depressa e melhor quanto menos pensa e mais age. É difícil compreender algo imprevisível, mas o português compreende fazendo. É essa a beleza de ser português.

pure poetry - genuine poésie














The Dreamers, Bertolucci

tríptico

já é bem mau haver quem não saiba, mas pior que isso é não haver quem ensine.

já é bem mau haver quem não saiba, mas pior que isso é haver quem não ensine.

já é bem mau haver quem não saiba, mas pior que isso é haver quem não aprenda.
não há grandes diferenças entre a medicina do nosso tempo e a religião que houve noutros tempos.

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2007

é incrível a influência que a medicina tem nas pessoas. Como é algo fácil de compreender por mentes positivistas, existencialistas ou simplesmente tacanhas (já que se extinguiram, ou estão quase extintos, os padres, dá um certo jeito controlar as massas sociais com alguma coisa, não é verdade?), é a nova religião do mundo. Os seus plenipotenciários espalham-se por todo o globo, mais tarde ou mais cedo são necessários para curar alguém, têm grandes templos erigidos à Doença e ao Fármaco, reivindicam tudo e nada, e podem fazê-lo, se não lhes der o que pretendem simplesmente deixam as pessoas morrer, e às vezes até as matam a troco de dinheiro. Alguns deles estão já formando uma nova elite, uma super-raça constituída pela melhor contribuição genética possível, apenas efectuando cruzamentos entre os mais dotados, quem sabe se o próximo passo não será exterminar velhos, deficientes e homossexuais?

muitas dessas criaturas, que até disso são alheias, melhor dizendo, as mais refinadas dessas criaturas, pensam que podem ter tudo na sua mão, explicar o mundo, a vida e o universo, o que existe realmente e o que não existe, e andam por aí, por todo o lado, na verdade, espalhando a sua boa-fé, a sua boa-nova, pregando ao peixinhos que, por má combinação alélica, desequilíbrio de produção proteica face a estímulo externo ou simples deficiência auditiva, não têm a sorte e o condão de merecer um grande resultado no teste de QI. E alguns são tão perfeitos na sua perfeição, autênticos Deuses incarnados, que não se limitam à mestria na sua área, mas também querem conquistar todas as outras, e arrancar suspiros e arrebatar pintores e poetas, escultores e historiadores, desportistas e cantores, actores e jornalistas.

mas felizmente os verdadeiros criadores sabem que tudo isso não passa de poeira para os olhos.
grande parte dos problemas do mundo resolver-se-ia se as pessoas soubessem comunicar.

Patafísica VII

Dedução 5:
V^(V) = V x V x ... x V
(V multiplicada V vezes)

Lei 12:
Aquele que levanta a sua Vida tantas vezes quantas as que sua Vida tem vive o equivalente a muitas Vidas.

Patafísica VI

Hipótese 1:
V + M = 0 => V = -M

Dedução 3: V x M
V x M = -M x M = (-1) x M x M = (-1) x M^2 = - (M^2)

por outro lado, como V = -M => M = -V vem
- (M^2) = - (M x M) = - (-V x (-V) ) = - (V^2)

pelo que pode vir ainda
- (M^2) = - (V^2) <=> M^2 = V^2 <=> (M^2) - (V^2) = 0

estando na presença de um caso notável da potenciação, diferença de quadrados, vem
(M^2) - (V^2) = 0 <=> (M - V) x (M + V) = 0

o desenvolvimento da equação pela aplicação da lei do anulamento do produto dá
(M - V) x (M + V) = 0 <=>
<=> M - V = 0 OU M + V = 0 <=>
<=> M = V OU M = -V

(!!!)

Dedução 4:
como V x M = M x V , pela propriedade comutativa da multiplicação, então para o caso M x V obtém-se o mesmo resultado

Leis 10 e 11:
Aquele que vê a Vida pela perspectiva da Morte, ou a Morte pela perspectiva da Vida, descobre que tanto ambas são contrárias como uma e a mesma coisa.


Corolário 5:
Tanto a quadratura negativa da Vida como a quadratura negativa da Morte quando enquadradas ambas levam à conclusão de que a Vida e a Morte são tão distintas como semelhantes.

Patafísica V

Hipótese 1:
V + M = 0 => V = -M

Dedução 1: V - M
V - M = -M - M = -2M = 2 (-M) = 2V

Conclusão: V - M = 2V

Lei 8:
Aquele que à sua Vida subtrai a sua Morte vive o equivalente ao dobro daquilo que uma pessoa que só vive a sua Vida vive.


Dedução 2: M - V
M - V = M - (-M) = M + M = 2M

Conclusão: M - V = 2M

Lei 9:
Aquele que à sua Morte subtrai a sua Vida vive o equivalente a duas mortes.

domingo, 11 de fevereiro de 2007

Fernando Pessoa preconizou o aparecimento de um Supra Camões, mas como era modesto na sua grandeza nunca afirmou que o Supra Camões era ele próprio.

Patafísica IV

Análise de um caso especial presente em Patafísica I

Quando se considera a Hipótese: V + M = 0
- se V = 0 => 0 + M = 0 <=> M = 0
- se M = 0 => V + 0 = 0 <=> V = 0

Quando se considera a Tese: |V + M| = 0
- se V = 0 => |0 + M| = 0 <=> |M| = 0 => M = 0
- se M = 0 => |V + 0| = 0 <=> |V| = 0 => V = 0

Quando se considera o Binómio: |V| + |M|
- se V = 0 => 0 + |M| = 0 <=> |M| = 0 => M = 0
- se M = 0 => |V| + 0 = 0 <=> |V| = 0 => V = 0


Lei 6:
Aquele que não vê nada na Vida também não vê nada na Morte, por muito que lhes tire o saldo.

Lei 7:
Aquele que não vê nada na Morte também não vê nada na Vida, por muito que lhes tire o saldo.
eu até percebo a necessidade de um referendo: se o governo tomasse uma posição quanto ao tema do aborto, ou mesmo apenas em relação à legislação em vigor, não conseguiria agradar a gregos e troianos e, portanto, perderia muitos apoios (leia-se votos eleitorais), qualquer que fosse a sua decisão. Assim, deixando o povo decidir, descarta-se de uma responsabilidade legislativa e, ainda por cima, alimenta a ilusão de que as pessoas podem, de facto, fazer algo pelo país decidindo acerca de uma lei que não vai resolver realmente questão nenhuma. Além disso, aproveita-se esta altura para desviar a atenção do estado em que está a Justiça portuguesa, que vai devagar ou parada, e isto quando anda, e do mesmo modo o Túnel do Marquês, os Apitos Dourados, os Sacos Azuis, os Vale e Azevedos, as Casas Pias, os Centros Petroquímicos em Sines e pelo Litoral Alentejano a esventrarem o último redutor costeiro verdadeiramente natural português e a mão-de-obra portuguesa para chineses ao preço da chuva. É caso para dizer: vai aqui um belo negócio-da-China.

O pior, no meio disto tudo, é que todos esses casos de que se ocupam os telejornais de 1h30 portugueses servem para as pessoas não pensarem acerca dos modelos educativos caquécticos que levam na escola, da desflorestação da Amazónia, da extinção de espécies, da exploração capitalista aos países do chamado 3º mundo, da globalização que sufoca a identidade cultural, ...
O erro da democracia é considerar todas as opiniões igualmente relevantes.

sábado, 10 de fevereiro de 2007

Patafísica III

Hipótese 2:
O Bem é o contrário do Mal.

Hipótese 3:
A Verdade é o contrário da Mentira.

Hipótese 4:
A Beleza é o contrário da Fealdade.

Hipótese 5:
A Justiça é o contrário da Parcialidade.

Hipótese 6:
A Harmonia é o contrário do Caos.

Indução (Lei) 1
:
Os contrários que por somatório se anulam seguem as mesmas leis derivadas para a Vida e para a Morte.

Patafísica II

Proposição 1:
Só se pode viver uma Vida, pelo menos de cada vez.

Proposição 2:
Assim como só se pode viver uma Vida de cada vez, também só se pode viver uma Morte de cada vez.

Corolário 2:
Quem nega a Vida e afirma a Morte não vive duas vezes a sua Morte, mas vive o equivalente em sua vida da sua Morte, para além de viver a Morte da sua Vida.

Corolário 3:
Quem afirma a Vida e nega a Morte não vive duas vezes a sua Vida, mas vive o equivalente em sua vida ao dobro daquilo que uma pessoa que apenas vive a sua Vida vive.

Corolário 4:
Alberto Caeiro viveu o equivalente a duas Vidas.
o nosso cérebro, melhor dizendo, encéfalo, é um órgão extraordinário. As células nervosas, também conhecidas como neurónios, que o compõem são capazes de emitir projecções dendríticas que contactam com outras células nervosas, aumentando assim a transmissão sináptica de informação. O que nos mostram os estudos científicos é que, de cada vez que aprendemos, essas projecções celulares lá esticam mais um pouco, e se diversificam para fazer com que as células contactem mais entre si. Ou seja, quanto mais aprendemos, mais esticam as dentrites, maior é a área de transmissão de informação, e maior é a possibilidade de interacção entre áreas diversas, e maior a capacidade para futuras interacções, e maior a sua complexidade, o que nos possibilita podermos aprender mais ainda, o que faz esticar ainda mais as dendrites, aumentar ainda mais a área de interacção, aumentar a sua complexidade, aprender mais, ...
porque é que as séries ditas juvenis sobre adolescentes só dão vontade de vomitar?

Patafísica I

Hipótese 1:
se a Vida (V) é o contrário da Morte (M), então:
V + M = 0 , o que implica que V = -M

Tese 1: Será que |V + M| = 0 ?

como |x| vem
se x < 0 , -x
se x >= 0 , x

vem então |V + M|
se V + M < 0 , -V-M
se x >= 0 , V + M

mas como V = -M, vem
-V-M = -V+V = 0
E
V + M = -M+M = 0

pelo que se conclui que |V + M| = 0 => Tese válida


Tese 2: Será que |V| + |M| = 0 ?


como |V| vem
se V < 0 , -V = M
se V >= 0 , V

como |M| vem
se M < 0 , -M = V
se M >= 0 , M

então,

CASO 1: V >= 0 E M >= 0
|V| + |M| = V + M = 0

CASO 2: V >= 0 E M < 0
|V| + |M| = V + (-M) = V + V = 2V

CASO 3
: M >= 0 E V < 0
|V| + |M| = -V + M = M + M = 2M

CASO 4
: M < 0 E V < 0
|V| + |M| = -V + (-M) = -V + V = 0


Lei 1:

Se a Vida é o contrário da Morte, então quem tira o saldo da Vida e da Morte em conjunto não vê nada.

Lei 2:
Quem tira o saldo da Vida e da Morte, separadamente, e nega a sua Vida e afirma a sua Morte, morre duas vezes.

Lei 3:
Quem tira o saldo da Vida e da Morte, separadamente, e afirma a sua Vida e a sua Morte, então não vive nada.

Lei 4:
A Lei 3 é também válida no caso de se negar ambas.

Lei 5:
Quem tira o saldo da Vida e da Morte, separadamente, e afirma a sua Vida e nega a sua Morte, vive duas vezes.

=> Tese válida somente para os casos 1 e 4


Corolário 1:

O módulo da Morte é a Vida.
a noção de professor como autoridade reverenciada, plenipotente e omnipresente, e não como pessoa que é, contribui e tem contribuído para a sua pedestalização.
1 - A Biologia é, no fundo, Química.
2 - A Química é, no fundo, Física.
3 - A Física é, no fundo, Matemática.
4 - A Matemática é, no fundo, abstracção mental humana.
5 - A abstracção mental humana é, no fundo, imaginação.

Logo, toda a ciência é imaginação.

P.S. - Proceda-se da mesma forma para a Geologia e ver-se-á que a conclusão se mantém.

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2007

Barcelona

uma homenagem à grande Rainha da Cataluña: Barcelona














Barcelona Barcelona
Barcelona Barcelona
Viva

I had this perfect dream
-Un sueño me envolvió
This dream was me and you
-Tal vez estás aquí
I want all the world to see
-Un instinto me guiaba
A miracle sensation
My guide and inspiration
Now my dream is slowly coming true

The wind is a gentle breeze
-Él me hablo de ti
The bells are ringing out
-El canto vuela
They're calling us together
Guiding us forever
Wish my dream would never go away

Barcelona - It was the first time that we met
Barcelona - How can I forget
The moment that you stepped into the room you took my breath away
Barcelona - La música vibró
Barcelona - Y ella nos unió
And if God willing we will meet again someday

Let the songs begin
-Déjalo nacer
Let the music play
-Ahhhhhhhh...
Make the voices sing
-Nace un gran amor
Start the celebration
-Ven a mí
And cry
-Grita
Come alive
-Vive
And shake the foundations from the skies
Ah,Ah,Shaking all our lives

Barcelona - Such a beautiful horizon
Barcelona - Like a jewel in the sun
Por ti seré gaviota de tu bella mar
Barcelona - Suenan las campanas
Barcelona - Abre tus puertas al mundo
If God is willing
-If God is willing
If God is willing
Friends until the end
Viva - Barcelona
a pedagogia, a que ainda existe ou resiste, morreu no final do Secundário.
o ensino é formação, mas a aprendizagem é instrução.
o ensino é a melhor forma de dar a forma que se quer às pessoas. É o novo fascismo ditatorial envolto em discursos emproados, falinhas mansas e paninhos quentes. É mais subtil, não apela a batalhas ou guerras, nem a derramamento de sangue, prefere antes começar desde muito cedo, instalando a pouco e pouco o dever e a obediência cega, a apatia, o sentido da autoridade, a disciplina, enfim, tudo aquilo que um civil necessita para ser um bom soldado e ir para a guerra (seja a do Iraque ou outra qualquer). Na Idade Média derramava-se sangue, é certo, mas tinha que se matar o adversário à espadeirada, e olhá-lo nos olhos. Hoje basta carregar num botão e rebenta uma ogiva nuclear no outro lado do mundo. Vive-se do anonimato socialista, fenómeno que faz saltar logo o seu contrário, por insatisfação óbvia, o sentido de se tornar conhecido e famoso perante toda a gente. Mas como quem se torna conhecido rapidamente por todos num mar de tantas peças saídas de uma fábrica de produção em série é quem salta à vista de todos, então reitera-se o culto do óbvio. Não se trata de uma meritocracia, ou de respeitar aqueles que já conquistaram o seu respeito por quem sabe, trata-se apenas de ser aquele que todos conseguem reconhecer. Mas como nascem hoje milhares ou milhões por dia, e outros tantos morrem, embora, e por enquanto, seja o saldo positivo, e como a espécie humana, como qualquer outra, está votada à morte, e como ser velho não interessa a ninguém, toda esta moda de ser famoso rapidamente cai em desuso, então renova-se todos os meses, todas as semanas, todos os dias. Todos têm os seus cinco minutos de fama, nem que seja para dizer porcaria, enquanto que milhares de crianças em África, e não só, morrem todos os dias naquilo a que muito clínica e artificialmente se chama o limiar da pobreza. Bem, pobreza é o que não falta, isto é, pobreza de espírito. Sejamos antes a pobreza em espírito, para ver se o mundo se pode cumprir inteiro.
gostava que as equipas de CSI's fossem mais realidade que ficção.

Mas melhor que isso era ir directamente à raiz do problema: ter Universidades Livres para todos.
Devo ainda salientar que Ostwald tinha ideias radicais sobre a educação. Opunha-se fortemente a uma educação preferencialmente humanista ainda vigente nessa altura; durante a sua vida lutou para acabar com o grego e até com o latim ensinado na maioria das escolas secundárias. Neste ponto teve pouco sucesso.
Além desta oposição, Ostwald era muito heterodoxo sobre o valor dos exames. Lembro-me de ouvir uma conversa entre ele e Wislicenus em que expressavam a opinião de que ninguém se tornaria importante na vida se não tivesse reprovado pelo menos um ano no ensino secundário. Ostwald tinha passado sete anos na escola secundária na Rússia em vez dos habituais cinco. Devo confessar que me senti muito deprimido com a conversa já que não tinha reprovado na escola secundária. Agora, volvidos estes anos, ao analisar de novo o assunto, reconheço que esses dois grandes químicos não estavam totalmente errados. Qualquer jovem que se adapte muito facilmente a qualquer sistema de ensino não deve acalentar ideias originais. Evidentemente, e isto é fundamental, deve analisar-se a razão pela qual um jovem "detesta" a escola. Se for simplesmente por incapacidade ou imbecilidade, não melhorará a sua vida futura; contudo, se for porque as suas aptidões e interesses são grandes em determinadas áreas e muito pequenas noutras, então o caso muda de figura. Ostwald era mau aluno na escola secundária porque, quando era jovem, era enorme a sua preferência pela Química. Fazer explosões sob a carteira da aula ou na cozinha da casa não melhoram as notas de um aluno mas decerto podem torná-lo num excelente químico. O nosso sistema educacional, porém, pode não estar adaptado às necessidades de um futuro "grande" homem. A maioria das vezes tais Homens tornam-se no que são, não em virtude do sistema circundante, mas sim como resultado da engrenagem de qualquer sistema e, consequentemente, os educadores devem estar atentos para elevar a média tanto quanto possível.
Ostwald era o homem mais versátil que jamais conheci, e o término da sua carreira prova-o bem. Os seus colegas tinham profetizado de que ele não seria "ninguém" considerando a sua "danada versatilidade" e certamente ele não era o tipo de aluno que se ajustava a um modelo educacional.
(...)
A extraordinária influência e sucesso de Ostwald como professor parece ser baseada em dois factos: a espantosa facilidade com que produzia novas ideias, mesmo em conversa, e a arte de lidar com os jovens, dando primordial importância à sua personalidade individual. Espero que me desculpem por relatar a experiência de um aluno - eu próprio. Ostwald soube do meu interesse pela música. Quando chegou o momento de escrever a minha tese, aconselhou-me do seguinte modo: "Deves escrever o trabalho como Beethoven compôs uma sinfonia. Pensa na 5ª Sinfonia: no segundo andamento, um pouco antes do final, ele dá ao segundo tema uma nova e impressionante variação. Isto é precisamente o que espero de ti. Imagina um quarto com uma janela; antes de acabares a descrição completa do quarto, abre a janela e mostra que espécie de paisagem se pode ver através dela". Um excelente conselho, mas duvido se será mais fácil seguir Ostwald do que Beethoven; na verdade, há necessidade de ter várias riquezas armazenadas. Pode antever-se em Ostwald um professor de grande categoria - ele sabia como impressionar um jovem de modo a que ele nunca mais o esquecesse; mesmo simples palavras serão sempre relembradas ao fim de muitos anos.
(...)

George Jaffé relata-nos a atmosfera do Laboratório
[de Friedrich Wilhelm Ostwald (1853-1932)] e descreve-nos a personalidade de Ostwald num artigo publicado no Journal of Chemical Education, em Maio de 1952.

...a dar-nos boas notícias

uma família viva...



o meu olhar é nítido como um girassol

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007

felizmente tem ainda Sísifo privilégios

não posso mesmo deixar de citar o meu bom amigo Miguel Drummond quando diz

Eu queria ouvir a opinião de um testículo sobre o tema do aborto, e não o que a cabeça pensa que o testículo deve dizer.

e devo acrescentar: e vivam as verdades de La Palisse! Ou como essa vetusta e decana lusa alma disse, estar vivo é o contrário de estar morto, Meu Deus! Eu nem quero pensar o que seria se estar vivo fosse o mesmo que estar morto - explicar o que é a vida ou o que é a morte é que eles não explicam, mas dizem logo que estar vivo é o contrário de estar morto...

já agora, deixo uma pequena reflexão, mercê do Senhor Drummond de Castro, para os 0,00001% de toda a população portuguesa que não têm um aborto na cabeça ou então que não os perpetuam intelectualmente:

e que tal falar um pouco do aborto da mente executado pela escola, a religião, a faculdade, o exército, as ideologias?


e que tal ver quais os privilégios que ainda restam a Sísifo?
muito piores que os abortos a zigotos, embriões, fetos ou bebés, são os abortos intelectuais do dia-a-dia

my dream

a partir do momento em que tomei consciência de que tudo podia ser criticado, em suma, de que tudo é relativo a um referencial, passei a expressar muito mais a minha individualidade.

o verdadeiro cinema


















O Último Imperador, Bernardo Bertolucci

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

Ai de ti, pobre Pessoa
Que em vida tão honrado
e empossando tanta Coroa
querem-te achar frustrado
- é o que muito hoje soa

Mas o melhor era ter cuidado
Com o que ser feliz significa
Que isso é coisa metida ao lado
(e não se explica)

Querem então achar frustrado
O aquilo que fazias
Quando frustrado era o estado
Do em que te não metias

Teu génio, absoluto
Escrevia conforme o vento
Teu estandarte o ir sendo
Mesmo em terreno dissoluto

E se mostravas saber tudo
Era porque não sabias nada
Do princípio até ao fundo
eras o ar que dava entrada
não sou nenhum bolo para me darem forma e me meterem num forno.
A Faculdade não pode ser faculdade disto ou daquilo, a Faculdade tem que ser uma Universidade.
lembro-me de, e sobretudo na escola, tentar sempre meter algo de mim naquilo que fazia, como se se tratasse de uma manifestação inconsciente de revelia ao actual sistema de ensino.
a razão pela qual o nosso bom Eça de Queirós está sempre actual é simples: se os problemas estruturais de Portugal ainda não foram resolvidos, então é natural que permaneçam sempre os mesmos.
existem dois tipos de pessoas: os que criam e os que criticam. Os que criam são os que não sabem criticar, e os que criticam são os que não sabem criar.
a escola não deve ser levada muito a sério.
a ideia de arranjar processos de produção de anticorpos monoclonais mais baratos que anda aí em voga parece-me bastante parca de ideias. Deviam-se era arranjar anticorpos contra os anticorpos de monoclones intelectuais, que tanta gente tem e que eliminam qualquer resquício de cultura, de espontaneidade ou de coisa viva. Isso sim, isso é que daria um belo prémio Nobel.
estavam a falar de Portugal e das repúblicas, e aí é que me dei conta de uma coisa: os portugueses não gostam nada de democracias, ou de repúblicas. A primeira nenhum tempo durou, e a segunda, que já dura, mais coisa menos coisa, o dobro do tempo da primeira, está prestes a acabar (será que alguma vez começou?).
pior que o poeta que só escreve prosa e diz que é poesia, só o cientista que se arma em poeta para só escrever prosa e estragar as duas.
a poesia que se faz hoje em Portugal tem a cruz de não ser poesia: é prosa. Ou então são punhados de sensações mal sentidas que se deitam para fora. Se realmente a queriam deitar fora, então porque é que a publicam? Já dizia o poeta que só a prosa é que se emenda, o verso nunca se emenda. E é por seu intermédio que digo: então vamos lá a emendar essa prosa toda, cheira mal, ocupa muito espaço e ainda dá ares de que se faz muita cultura em Portugal. A cultura que se faz realmente, se é que ela se faz, parece-me a mim toda escondida, ou abafada, pela prosa.
quando era mais jovem gostava muito de ecologia. Depois tive uma cadeira de ecologia na faculdade e descobri que ecologia era estatística. Apercebi-me então que gostava era de ambiente e ambientalismo, não de ecologia. Até mesmo a geografia física e a biogeografia são muito mais interessantes.
o que é preciso é saber ir boiando

terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

não me parece que o papel vá desaparecer como suporte escrito. Mas uma coisa é verdade, consegue-se escrever muito mais depressa teclando as teclas de um computador do que escrevendo a papel e a caneta, pelo menos de forma legível. Isto, claro, se o utilizador estiver tão treinado a escrever teclando em botões de plástico que não precisa de olhar para eles, ou então precisando apenas de muito pouco lhes dar mirada, para poder escrever o que quer que seja, o que é uma ideia bastante atraente.

parece-me assim que, para essas pessoas, aprender a arte da dactilografia é bastante útil. Pode-se chegar a um nível de fluidez mental em que os pensamentos discorrem todos para se encontrar rapidamente materializados em letras e palavras. Estreita-se o abismo entre a velocidade do pensamento e a velocidade da materialização, da escrita, da palavra. Claro que o pensamento permanece, como a velocidade da luz, inacessível, por vezes, se essa fluidez mental é grande - insatisfação de se estar vivo. Mas, enfim, já se vai ficando mais genuíno.
gostava de ver o Pessoa a mexer nestas novas tecnologias. Devia ter um blog por cada heterónimo, ou talvez por cada dia do ano, ou por cada hora de momento.
a verdade é que o mundo não me deixa de espantar, em toda a sua beleza, profusão e originalidade. Grande é a vida, grandes são as pessoas!


Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças
se pudesse arranjar uma palavra para descrever, analisar e sintetizar o que é o pensamento, diria que a palavra imprevisível serviria muito bem para o caso.

nós não somos donos do nosso pensamento (lá está o despontar da terceira ferida narcísica do homem), o pensamento é que é dono de nós. Quer queiramos, quer não, temos de submetermo-nos à sua vontade, como se fôssemos seus escravos e dele dependesse toda a nossa existência, ou pelo menos toda a nossa consciência, ou se por uma questão de terminologia preferirem, sanidade mental. Os verdadeiros loucos são aqueles que não se submetem ao seu único senhor, que é o pensamento. Mesmo que ele diga para aqueles não pensarem. Mesmo que ele próprio diga e afirme, a pés juntos, que não existe, e que é apenas mais um reflexo de lua na superfície calma de um lago, e não a própria lua.
na televisão encontra-se de tudo. Como aqueles programas em que uns certos especialistas em moda, decerto Doutores nessa área, tal é a sua sabedoria, se propõem a mudar o visual de uma pessoa qualquer, dita ordinária, ai esta linguagem, vamos lá a não ferir susceptibilidades nenhumas, querendo mudar o visual de alguém para que se pareça uma executiva, ou um executivo, do século XX, diriam alguns do século passado, posto que estamos no XXI, então querem eles dar-lhes a cara de umas reminescências de cultura pop, do sentido do descartável e da noção do efémero. E as pessoas, as visadas, ainda deixam. Eliminando qualquer vestígio de individualidade corporal, e por vezes também psicológica, à espiritual é que não chegam, mas quanto ao psicológico ainda conseguem lavar uns quantos cérebros mais abertos à mudança, então vão eles por ali fora, menosprezando esses atributos, particulares, e únicos, e tentam mudar tudo quanto podem, segundo os seus próprios gostos pessoais. Não pode este ser um desejo imensamente narcísico, quiçá alguma ferida, do ego, que os faz mover-se assim?

perante este quadro tão próprio na sua cultura, que é a ocidental, capitalista e descartável, que, à semelhança das donas de casa dos anos 50 do pós segunda grande guerra, quer incutir, ou programar, nas mentes jovem e frescas o sentido de obediência à sociedade (coisa que gostava de saber o que é, nunca ninguém ainda ma soube explicar), à cultura do desperdício, à casa, e ainda a esse desejo tão nobre e tão elevado espiritualmente que é arranjar um parceiro sexual, e não importa qual, o que interessa é que tenha bons genes, e ter sua ninhada de filhos, como se de uma besta, outra vez esta linguagem, e pensar que besta no tempo do Eça significava um animal de carga ou de transporte de veículos, isto é, como se de uma besta se tratasse, e se ela chateasse muito a gente, davam-se uma chibatadas e resolvia-se a questão. Eu até compreendo a situação, o nosso mundo, nosso é como quem diz, o mundo em que nós vivemos, vá lá, e já ficam as contas mais certas, esse mundo, está votado ao esquecimento, e tudo por culpa das políticas antinatalistas, por um lado, e por outro da emancipação da mulher, sem ofensa às feministas.

mas de repente dei por mim a pensar o que seria se uma tribo da papua nova guiné, ou se os próprios maori, ou se os nómadas que percorrem o deserto do Saara, ou ainda se os índios ameríndios, os que ainda existem, claro, ou se os chineses lá na suas aldeias remotas, ou então os monges budistas, ou taoístas, ou os esquimós, ou até os habitantes da tribo masai, resolvessem fazer eles um programa semelhante. Decerto se iriam rir muito dos vestidos e das roupas que trazemos, das nossas aparências, dos nossos narizes, das nossas tristes e alegres figuras (às vezes já nem se sabe bem qual é qual), e aí é que havia de ser bonito: os ocidentais rapavam o cabelo todo, e punham aquelas vestes púrpuras e laranjas dos budistas, ou então aqueles grossos casacos de lã dos esquimós, e as botifarras, ou então vinham antes para a moda do tudo ao léu como Deus o deitou ao mundo, salvo a tanguinha respectiva, para melhor acomodação dos seus pertences, que é como quem diz, numa linguagem ocidental, das suas gónadas e dos seus gâmetas, das suas jóias da coroa ou então do seu património genético pessoal e transmissível.

uma coisa é certa: cada um é o que é, ou pelo menos devia ser, mas sobretudo cada um vê o que é, e acaba sendo o que vê.
uma das coisas que mais me surpreenderam até hoje foi o ficar a conhecer que a evolução da ecologia e a evolução da economia não são mais que dois aspectos da mesma moeda. E até a própria origem da palavra, oikos, diz tudo. A ecologia estuda a organização inteligível, intelectualizável e racionalizada das relações que se estabelecem na casa dos seres vivos, entre aquela e estes, e entre eles próprios. As relações que se estabelecem entre os diferentes domínios da casa. A economia estuda a gestão da casa, do espaço, no tempo. Realmente, quando as pessoas falam destas duas, parece que estão a falar da água e do fogo, do céu e da terra, do bom e do mau, incluindo a noção de que são ambas mutuamente exclusivas da outra. Não pode haver ideia mais errada. Uma ideia engraçada e, ao mesmo tempo, interessante, é aquela que funde as duas, e que se pode apresentar da maneira que já têm vindo a descrevê-la:

A Economia da Natureza

porque, de facto, a Natureza é económica, em si, e sabe gerir muito bem as suas contas, os seus balanços positivos e negativos, e de tal modo que nunca a balança fique em deficit ou em superavit, ao contrário de tantas bolsas de tantos países que por aí há. Devíamos aprender esta lição com a Natureza: que tudo o que se dá, é aproveitado pela vida, para que ela se possa desenvolver, e florescer, e mostrar todo o seu esplendor numa selva caótica de uma ordem gerida parcimoniosamente, e que tudo o que se tira tende a ser reposto, para que o caos não se perca, isto é, para que reine a diversidade ainda, mas também, e importante, para que a ordem de encadeamento das relações entre os seres não se altere, porque, também, se formos a olhar direito para o assunto, vemos que não há outra possível: é aquela que sempre existiu.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

nunca gostei de economia. Mesmo desde o tempo do secundário. Só o Agostinho da Silva é que me fez gostar de economia - é que no mundo em que nós vivemos hoje, se queremos fazer alguma coisa por ele, temos que conhecer-lhe as manhas, e isso passa por conhecer o paradigma económico, capitalista, em que estamos mergulhados até à espinha.
realmente, e como Caeiro diz, e bem, ver uma coisa e pensá-la é muito diferente. Pensá-la é deturpá-la, porque metemos sempre de nós na nossa interpretação. Deve ser um princípio metafísico, este de só falarmos biografia por todos os nossos poros. Não vale a pena. Só dizemos aquilo que somos. E aí está. Como se quiséssemos dizer ao mundo todo aquilo que nós somos - nós, que somos parte do mundo, ou que o somos também por inteiro, porquanto não existe nada que diga que somos distintos dele e ele de nós.

se quisermos fazer a análise lógica do assunto, podemos dizer que, ao pensar, isto é, ao interpretar um fenómeno, que nos chega aos olhos, estamos a transformar esse fenómeno (o que observámos com os olhos) em um pensamento (o que pensámos com a cabeça). Parece-me ser essa toda a noção da Autopsicografia.

Esse processo transformante deve consistir numa alteração do fenómeno, um rearranjo das partes que compõem o todo, à nossa maneira, porque somos nós que o vemos, excepto se estamos a resolver uma equação matemática, que aí só valem as regras da lógica aristotélica. Bem, mas mesmo essa lógica foi o Aristóteles que a inventou, e portanto também era mais um pensamento, fruto da cabeça dele. Não tem nada de natural, de facto, já que a realidade não se rege por números precisos como o um, o dois, o três... a realidade rege-se apenas por números que se desconhecem, apenas estimáveis dada a precaridade dos nossos meios de medição. Até o que chamamos área do círculo é directamente proporcional à proporção pi, que é um número não exacto. Talvez seja isto uma das muitas ironias do destino, ou um sentido de humor divino, já que mesmo na figura geométrica mais simétrica e perfeita de todas, no plano, no espaço já será a esfera, não conseguimos lhe tirar as medidas de forma precisa, mas apenas decorrentes da imprecisão numérica que acompanha esta matemática toda que inventámos.

E a coisa curiosa é que essas equações conseguem bater sempre certas.
depois do encontro sobre história da ciência fiquei a saber que realmente a história é mesmo bafienta. A sala até estava composta, mas mesmo assim devia ser a pessoa mais jovem que ali estava, coisa que me deixava um pouco constrangido. Em boa verdade me passou pela cabeça a ideia: e então o que acontecerá quando todas estas pessoas morrerem? Será que irá haver continuidade nesta área? Enfim, é como tudo o resto, um espelho de Portugal. Poucas pessoas fazem realmente alguma coisa, e esses poucos são na sua maioria velhos.

confesso que as ideias que se vão tendo da evolução da história, e da evolução da ciência, em suma, da evolução do pensamento humano, são interessantes, e muito. Mas não posso deixar de sentir que existem paradigmas de pensamento, ou barreiras mentais, que impedem que se vá mais além. E isso neste caso significa fazer. Vivemos neste momento mais uma crise (será que alguma vez saímos dela?), mas ela também é fruto das imposições mentais que as pessoas colocam sobre si mesmas, sobre o mundo. É verdade que se faz boa investigação, e que ela é necessária. Mas se calhar não é só preciso andar à procura de máquinas e pedras e colecções antigas, é certo que também é preciso conservar as que existem, é certo que é preciso restaurar o que se pode, é certo que é preciso inventariar o que se conseguir encontrar, mas é preciso também ter olhos de presente voltados para o futuro. E o que é realmente preciso agora, nesta época de grandes avanços na área da comunicação e da cultura, é organizar esses dois domínios. É preciso trazer escritores e pintores e todos os demais artistas aos museus, a falar, a conferências, às escolas, às universidades. E é preciso levar as universidades às escolas, às secundárias e aos restantes estabelecimentos. É preciso criar cafés de cultura, e salas de musas, para não deixar morrer os museus.

os museus são algo que me aparece na mente como parado no tempo. Não evoluem. E isso é algo extremamente estúpido, parece-me, limitado, porque neste mundo tudo muda. E se os museus não mudam também, então passam a fazer parte somente do passado, e claro que ninguém lhes vai ligar nenhuma, se eles não mantiverem a sua ligação com o presente. É, por isso, preciso levar as pessoas aos museus, e levar os museus às pessoas. Talvez a primeira seja a mais fácil de implementar, pelo menos numa primeira fase. Criar espaços nos museus onde se possa tomar café, conversar, ou simplesmente criar. Não seria um ambiente muito mais rico para todos? Caramba, uma, duas salas, não seria suficiente para criar espaços onde as pessoas pudessem ir, não falo de Lisboa ou do Porto, falo de cada Município, de cada terreola que tem um museu. Porque não? Porque é que é necessário ir a centros comerciais de modelos importados do estrangeiro para se tomar um café? Um museu serve perfeitamente, é ainda por cima é mais interessante porque alberga coisas que podem ser visitadas, conhecidas, apreciadas. O museu tem que voltar a ser uma casa das musas, algo onde as pessoas podem ir para colher inspiração, ou para se poderem dedicar à análise e à intelectualização, ou então onde as pessoas podem ir simplesmente para conversar, ou para trabalhar, isto é, para fazer projectos, espectáculos multimédia, e é bom usar estes neologismos, que só áudio e vídeo já passou à história.

Vamos insuflar de vida os museus! Vamos empurrar as pessoas para lá, para que os fiquem a conhecer, para que não tenham a noção de que só poucos podem ser artistas, para que achem que não têm em si arte nenhuma, para que se possam inspirar e ter uma relação física, próxima, com os quadros e com as esculturas. Caramba, se for preciso, que se deixe as pessoas tocar nas obras, senti-las perto da pele, para ver se as sentem também perto do espírito, e deixe-se que elas possam conversar com quem elas faz, para ficarem a conhecer mais, mas num ambiente informal, descontraído, onde as pessoas possam falar do que acham, onde possam trocar ideias e experiências e criação, e mesmo sensações. Uma sala com mesas e cadeiras, uma máquina de café, papel, lápis e canetas, será isso tão difícil de arranjar?