Falar do objectivo do cinema é, antes de mais, achar que o cinema tem um objectivo. Nada de mais errado. O cinema não tem, nem pode ter, nenhum objectivo. O cinema é pura e simplesmente uma expressão da criatividade humana, e a criatividade humana não tem nenhum objectivo.
O homem é um ser criador por natureza, e portanto não pode viver sem criar. Há no homem um instinto natural para a criação, e essa criação é sempre a expressão do seu potencial individual. O objecto criado - seja ele qual for - procede sempre da sua criatividade (ela é a sua causa), mas não surge para um fim definido. Para que surge a ideia de um filme quando um filme não passa de uma ideia? Para nada. Não há qualquer utilidade que lhe possamos apresentar.
O homem tem prazer em criar coisas belas, o homem também tem prazer em contemplar essas coisas belas; mas isso em nada nos diz que uma obra tenha um objectivo, e que esse objectivo é o de dar prazer, ou servir a contemplação de alguém: isso é apenas uma consequência natural do processo criativo. É por isto que é tão difícil justificar a existência das artes numa sociedade doentiamente utilitarista e perversamente capitalista. E, contudo, é esta grande diferença que nos separa dos restantes animais.
Sendo o criar aquilo que de mais natural o homem tem, não é menos verdade que nem todos se podem entregar livremente ao processo artístico. Estamos longe de viver num mundo ideal. E todas essas imposições utilitárias, práticas, e capitalistas, acabam sempre por se sobrepôr. Não está certo. Mas é exactamente por todas essas imposições que o cinema deve ter um objectivo, uma utilidade.
É certo que o cinema tem, de algum modo, ter uma utilidade capitalista. Sem receita para investir - venha ela de onde vier - não há cinema nenhum. Mas é ainda mais importante que o cinema tenha um objectivo, uma finalidade prática, uma utilidade. Note-se que a existência de uma tal utilidade não rebaixa a importância do cinema, mas antes a eleva - porque esta passa a ter não uma, mas duas funções nobres. Qual deve ser então o objectivo ou a função do cinema?
É a existência de uma sociedade com estas características que faz com que o homem permaneça escravo do capitalismo, que o subjuga até ao suicídio da sua própria humanidade. Assim, o cinema não pode ter função mais elevada no mundo em que vivemos que ser orientado num tal sentido que a sua mensagem leve à destruição da sociedade capitalizante que temos. Só assim poderá o homem um dia criar em verdadeira liberdade.
Portanto, apesar do cinema não ter qualquer objectivo ou finalidade, enquanto vivermos no mundo em que vivemos, temos de injectar em cada obra, e da melhor maneira que lhe servir, um pendor anti-capitalizante, o triunfo da arte sobre o peso que esta terrível economia tem sobre nós. Só assim poderemos chegar a um mundo verdadeiramente livre.
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