domingo, 5 de outubro de 2008

Método verdadeiro para perceber o que as pessoas valem

Este método científico é infalível, e tem resultado sempre que aplicado a vários e diversos contextos.


1 - Sempre que se faça uma pergunta, que seja subjectiva.
A subjectividade inerente à pergunta feita vai levar a que a outra pessoa seja obrigada a interpretá-la da maneira que melhor acha. Como a maneira como a pessoa a interpreta é, na verdade, aquilo que a pessoa é, então, ao responder, essa pessoa vai dizer aquilo que é.

2 - Sempre que se faça uma pergunta, não se interfira até que a resposta seja dada.
As perguntas devem ser neutras, não tendo qualquer valoração positiva ou negativa acerca do assunto que é levantado. A influência do observador deve ser minimizada ao máximo, de forma a que a outra pessoa se sinta o menos coibida possível, e, portanto, mais apta a dizer aquilo que realmente pensa, e não aquilo que ela pensa que seja melhor dizer no contexto social em que se encontra. (Deve aqui notar-se que é contexto social toda a circunstância em que se encontram mais de uma pessoa juntas.)

3 - Sempre que se faça uma pergunta, nunca se deve ficar por aí.
Após uma pergunta, a pessoa observada deve ser bombardeada com mais perguntas (como se disse, sempre subjectivas). A sucessão contínua de várias perguntas descontínuas leva ao desnorteamento da transitória racionalidade que por vezes a mente humana fabrica para se proteger dos ataques da ignorância mundana, o que resulta no enfraquecimento da censura freudiana e na libertação mais imediata daquilo que vai no inconsciente.


Ponto adicional:
Segundo alguns psicólogos, só é possível saber exactamente como aplicar esta técnica analítica (deve-se distinguir ainda que a análise só está no método a utilizar, já que o resultado que se pretende é uma resposta sintética) da melhor maneira depois de se ter sido submetido à própria técnica. O que os anos de experiência neste campo nos dizem é que esta posição é não só plausível como inteiramente justificada. E, dada a imprevisibilidade do mundo em que vivemos, é melhor que se prepare quem quiser seguir este método: é que a aplicação da técnica ao observador aparece sempre quando ele menos espera.

2 comentários:

Carlos Pereira disse...

Costumo concordar em muitas coisas contigo, mas neste ponto discordo em absoluto. Em primeiro lugar, a utilização de um método deste tipo pressupõe o ser humano como uma máquina de agir e de pensar. Claro que há ritos, hábitos, previsibilidades na lógica do discurso. Mas isso é a excepção à infinidade de imprevisibilidades a que cada um de nós se encontra sujeito. São tantos os factores e condicionantes, os contextos e os estados de alma, que é impossível chegar à essência de alguém desta forma (fórmula? tanto mais risível). Podes obter traços gerais e superficiais, talvez os mesmos de uma primeira opinião. Não mais do que isso, e ainda bem, porque é a única forma dos enigmas continuarem. Além do mais esta excessiva intelectualização por parte do inquisidor impede qualquer diálogo genuíno, qualquer conexão válida. Ou seja, o inquisidor de nada vale, é uma farsa. Para extrair essências e atingir índoles, existe o inesperado e os extremos efémeros das vivências. Procurar demais pode provocar cegueira crónica.

Daniel disse...

(Mas que bom é haver pessoas que discordam de nós! - se não as houvesse, ainda podíamos pensar que tínhamos sempre razão...)

Toda a ciência, ou melhor, todo o método que se diga científico se baseia na perturbação do normal curso de um sistema (o objecto de estudo). O sistema é considerado como uma máquina de causalidades, e máquina no sentido em que é capaz de dar respostas a determinados estímulos que lhe são apresentados. Este é um grande problema do processo de conhecimento perfeitamente objectivo: pode muito facilmente levar à mutilação-deformação dos seus intervenientes, e é sobretudo por isso que não é perfeito. Chegar à essência de alguém, àquilo que alguém realmente é, é impossível - para isso teríamos que ser a outra pessoa, e cada um não pode deixar de ser aquilo que nasceu. Ou pode? Bom, a resposta talvez esteja nessa conversa, na união de que falas. Isso é uma noção importantíssima. Se duvidarmos de tudo como Descartes, e se exigirmos prova que fundamente tudo aquilo que acontece no mundo, forçosamente chegamos ao ponto em que temos de dizer "de tal coisa, eu não tenho a certeza". E, aí, acaba a ciência, que podemos chamar de velha, e começa a ciênca nova, que é a ciência de saber unir os contrários. Nós podemos apresentar várias razões para explicar porque é que Pessoa era assim como era. Mas, para o entender realmente, para o compreender, digamos assim, no poema que ele era, só temos uma solução: procurar unir-nos o mais possível com ele. Como é que isso será possível, se não podemos nós deixar de ser quem somos?! É um problema difícil; mas que a união existe, lá isso existe. E até traz consigo a compreensão desse inesperado que toda a gente, melhor ou pior, é. Então, temos de concluir forçosamente que, se nos conseguimos unir uns aos outros, é porque a nossa substância, a nossa essência é a mesma. Tudo é Um. Tudo é múltiplo, criativo, inesperado e diverso; mas tudo é, na essência, o mesmo ponto inicial de onde tudo proveio. E, aí, como é que se explicava a existência da diversidade? Ora, pela expressão diferencial de uns ou outros aspectos face ao contexto limitado e espácio-temporal. Tudo é Um, mas, neste mundo finito, limitado pelo tempo e pelo espaço, esse Um - que é a única coisa que existe, de facto - não se pode expressar de todas as maneiras, de uma só vez. Para isso precisava da eternidade! Então, vai-se expressando de uma forma ou de outra ao longo da história. E, se calhar, quando achar que já se expressou o bastante, volta a si próprio, Um, para contemplar tudo quanto é. A verdadeira ciência está na união, não na dissolução (a dissolução pode ser é usada como processo criativo para chegar à união, e temos aqui o excelente exemplo do Pessoa). Portanto, quer isto dizer que o método de que falo ali é antes o método que a vida utiliza em nós para nos aperfeiçoar e lapidar até ao máximo nível de entropia (a expressão de todo o inconsciente), e não a conhecer aquilo que somos ou aquilo que os outros são. Se nos propomos a utilizar este método, é porque queremos o bem da humanidade, e testamos cada homem a superar-se a si mesmo pelo confronto entre o que a percepção do outro tem e que define aquilo que o um é (só existe o eu porque o sabemos diferenciar do não-eu, senão tudo era visto como o mesmo).

Um grande abraço do teu eu-não-eu.