domingo, 11 de maio de 2008

educação sexual ou não

Uma das questões que gostaríamos de ver resolvidas de uma vez por todas é essa de se decidir se se dão aulas sobre educação sexual ou não. Na verdade, surge por vezes a discussão caricata sobre o tema, completamente desprovida - como aliás conseguimos ver todos os dias - de algum sentido de lógica ou de estruturação e planeamento. Dizer que são necessárias aulas de educação sexual nas escolas portuguesas é escamotear as questões verdadeiramente importantes. Antes de mais, fala-se em educação sexual sem se definir em que é que a dita consiste, e geram-se inúmeros equívocos à sua volta que apenas contribuem com mais tijolos para as paredes da ignorância. Quando falamos em educação sexual estamos a falar do quê? Se estamos a falar de educação sexual, estamos a dizer que deve existir alguma deficiência no nosso sistema de ensino, na educação que damos aos nossos filhos, em relação ao tema da sexualidade. Se existe falta de educação; corrigimos: se existe falta de informação especializada e clara acerca do que é a sexualidade, então é certo que esta informação tem forçosamente que ser dada a todos - não estamos a falar só de currículos escolares que são avaliados melhor ou pior com exames ou provas de aferição, estamos a falar de informação fundamental para toda a gente, e que diz respeito a essa vertente tão nossa e pessoal que é a nossa sexualidade. Identificado o problema, e tendo posto muito claramente a tónica na deficiência que se vive no nosso sistema de ensino - e sublinhe-se que esta deficiência está longe de se restringir faltas de informação a este nível - , é preciso agora definir muito clara e objectivamente o que é que se entende por educação sexual. Informação é precisa, é certo. Mas sobre o quê? Em que aspectos? Quando falamos em sexualidade estamos a falar em quê? Se formos à Psicologia, podemos dizer que estamos falando de processos mentais, emoções, sentimentos, afectos, o amor; mas também de comportamentos: de identidade sexual, de relações sexuais, da própria fisiologia do nosso organismo. E também podemos concordar com o facto de que estas questões, embora extremamente complexas e só plenamente compreendidas à luz de uma psicologia global e integrada da pessoa por inteiro, radicam exactamente na biologia do corpo de cada um. Como estas questões radicam na biologia do corpo, então elas são parte integrante da Biologia, a disciplina científica que estuda a vida. Como tal, o primeiro passo a dar para erradicar qualquer falta de informação ou desinformação que exista, é simplesmente garantir que toda a gente tem uma noção das características do seu próprio sistema reprodutor. Essa é a base a partir da qual se podem construir as aprendizagens de temáticas mais complexas que estão agrupadas na Psicologia. Assim, o segundo passo será conseguir incluir nos currículos escolares não só informação acerca do sistema reprodutor humano como também informação acerca daquilo que envolve a nossa própria sexualidade, e que é muito mais vasta que o nosso sistema reprodutor. É imprescindível analisar tão claramente quanto possível a natureza, ou as características, do impulso sexual - e para isso temos as teorias da motivação de Maslow, as teorias do desenvolvimento psicossexual de Freud, as análises estatísticas de Kinsey, as teorias do desenvolvimento psicossocial de Erikson, para não falar dos estudos sobre a vinculação, adolescência e personalidade. Todos estes temas devem ser parte integrante da instrução de um adolescente. Todos estes temas precisam de ser bem explorados e analisados porque são completamente imprescindíveis para a compreensão de si próprio e do mundo.

6 comentários:

Anónimo disse...

Tenho de discordar. Sim, há uma severa deficiência no nosso sistema de ensino. Mas que há finalistas de secundário a concorrer ao ensino superior, há. Que há pessoas, como tu e eu, que têm perfeita consciência de uma educação sexual, sem nunca ter tido qualquer apoio ou docência nessa área, há.

Há sim uma deficiência no sistema de ensino. Talvez seja o sistema de ensino que temos em casa...

Antes de uma Educação Sexual nas escolas, pudesse talvez haver um Civismo, ou um Relacionamento Social.

Abraço

Daniel disse...

Com certeza que há deficiências, e profundas, no sistema de ensino que nós temos. Mas também é verdade que há grandes deficiências quando olhamos para os relacionamentos entre pessoas. Não é preciso que haja disciplinas sobre Civismo ou Relacionamento Social ou coisa que o valha... simplesmente, esses são temas que não se ensinam em disciplinas, não é? Ou existe uma ligação pais-filhos em que a comunicação entre eles consegue com que a sabedoria de uns instrua os outros, ou então vivemos de tvs e macdonalds... e ficam eles a educar as crianças, em vez de as deixar em liberdade ou com os avós. O problema é o ritmo de vida acelerado, e cada vez mais acelerado, que levamos. À escola - e aos professores - não podemos atribuir todas as responsabilidades. Os pais também são professores, e são dos mais importantes, são os que nos acompanham ou devem acompanhar desde o início... E, portanto, é aí que as coisas devem começar. O que precisamos é de mudar a sociedade, e é preciso frisar muito bem que isto significa simplesmente que temos de encontrar uma forma de organização social que promova o contacto entre as pessoas, a comunicação. O papel da escola deve ser o papel de transmitir o conhecimento já mais específico, mais especializado, que os pais muitas vezes não têm. A escola tem o seu papel. Os pais têm o seu papel. A questão aqui é que cada um tem de cumprir o seu papel, e quando isso acontecer tudo estará bem. Claro que sempre houve e há sempre quem tenha a sensibilidade ou a consciência para captar a essência dessas matérias, ou quem se interesse por elas e procure aprendê-las, e consiga e tenha facilidade em aprendê-las, mas não nos podemos fiar só nessas pessoas. Só podemos descansar quando tudo estiver disponível para toda a gente. E sonhar menos que isso, neste mundo, é não sonhar de todo.

Abraço

Anónimo disse...

Precisamente. Tão pouco deveria ser Educação Sexual uma disciplina leccionada nas escolas (assim como o Civismo).
O salto lógico de pensamento, que raramente se encontra, é aceitar que mudar uma sociedade demora, no mínimo, uma geração.
Mudar no sentido de compartimentalizar o que deverá ser instruído na Escola e o que deverá ser instruído em casa, sendo que em casa, figurarão esses temas.
Ora, não me ocorre uma única pessoa que tenha a paciência de esperar (pelo menos) uma geração para que note mudanças significativas de ensinar o quê e onde a uma criança.
[Aliás, a alternância de governos PS - PSD - PS - ... denota claramente uma certa falta de paciência]
Terá a ver com o estilo fast food e food fast de vida? Quer tenha, quer não tenha, parece que ao utilizarmos esse meio como veículo de projecção poderemos fazer alguma diferença.
Uma geração "Morangos com açúcar" não cai do céu. Talvez se houvesse melhores argumentos e diálogos realistas, situações e grupos de pares com que, quem visse a série, se identificasse, então estaríamos no bom (melhor) caminho para uma educação 'caseira'.
Talvez não.
Talvez a selecção natural actuará por si (confio e tenho mais esperanças neste último).

Abraço

Daniel disse...

É então claro que Educação Sexual não tem razão nenhuma para existir... uma boa Biologia, e uma boa Psicologia dão perfeitamente conta do recado. Agora, faltam programas escolares realmente interessantes, não é verdade?... Não sei se para mudar isso será preciso esperar uma geração inteira... aliás, o que nós estamos observando agora é que quanto mais a história anda para a frente, mais depressa a história avança, exactamente como as galáxias. Ferramentas como todos estes meios de comunicação que temos à nossa disposição são meios ideais para derrubar os muros da ignorância. O problema é que andam a querer matar o tempo livre, que é a maior bênção que o homem já teve. O que nós temos de dizer, e insistir teimosamente, é que com o desenvolvimento tecnológico que o mundo vai levar toda a gente vai passar a usufruir desse tempo livre. E é assim que temos de ver o mundo do futuro. É ainda por isso que esta situação não se trata de uma selecção natural; o que é preciso é uma selecção cultural daquilo que é boa cultura - e o resto vai para o sucateiro. Cultura é tudo aquilo que surge naturalmente como forma de expressão individual da liberdade de cada um. Agora, cada um que dê liberdade à sua!

Abraço

Anónimo disse...

... excepto José Luís Peixoto. Tudo vindo dele, não.

Daniel disse...

O Peixoto é menos parvo do que pode parecer, mas também é, ao mesmo tempo, menos interessante do que poderia ser. Ainda que o senhor pegue em coisas interessantes, o discurso dele é um bocado ultrapassado... já sabemos que filosofias existencialistas como aquelas não são capazes de dar resposta às perguntas de hoje. Parece-me que é aí que ele falha redondamente. Mas o que interessa é produzir e vender o mais possível, não é?