quinta-feira, 15 de maio de 2008

Quando falamos de produção literária só se podem fazer duas coisas originais: ou se critica aquilo que já existe - e atenção, porque isso pressupõe que se conheça previamente o objecto da crítica - , ou se inventa alguma coisa que ainda não exista. Coitadas das aulas de sociobiologia do senhor Richard Dawkins! Reduzir a cultura humana a umas meras unidades meméticas é esquecer que existe uma variabilidade - que pelo menos por enquanto nos parece aleatória - no aparecimento de novos elementos inesgotável e que perpetua o carácter excepcional de cada ser humano. A atitude mais reles que podemos encontrar num humano é a da cópia indiscriminada sobre o que quer que se encontre no mundo, especialmente naquilo que faz parte da publicidade.

A crítica, porém, não atinge a grandeza da invenção. A invenção, a ideia original, nasce de lugares que permanecem até hoje desconhecidos para nós. A crítica debruça-se sobre algo que já existe, apenas realçando mais determinados aspectos que ao crítico parecem mais importantes, em detrimento de outros. Mas a actividade do crítico torna-se verdadeiramente uma arte, um monumento à humanidade, quando ele consegue transformar o mais abjecto pedaço de coisa em algo que pode servir de inspiração a essa humanidade.

Por outro lado, também podemos discutir [neste ponto é favor consultar a etimologia da palavra] a tarefa do inventor, e se a natureza da sua tarefa faz com que ela seja assim tão grande. Se aceitarmos que o nosso entendimento, ou a nossa mente humana, é uma tabula rasa, então falamos de invenções menores. Estas invenções só existem por combinação de elementos pré-existentes, e portanto não-originais. Mas em defesa desta tarefa, que também nos parece nobre, temos que referir os já falados princípios emergentes. À medida que pomos e dispomos as palavras para construir textos, o todo é sempre muito maior do que a soma das partes. Isto acontece com as letras que reunimos em conjuntos para formar palavras e acontece também com as palavras que reunimos em conjuntos para formar frases, e assim sucessivamente segundo diferentes níveis de organização da complexidade. Consoante as combinações de palavras que fazemos, assim diferentes propriedades, contidas numa forma embrionária, latente ou bloqueada, são libertadas. Estas propriedades não podem ser previstas teoricamente apenas pela análise das partes isoladas desse todo que consideramos. As leis derivadas da Ecologia são perfeitamente transponíveis, num nível apropriado, para a estrutura da Linguística.

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