quinta-feira, 5 de abril de 2007

Sinto um horror às coisas banais.
Um não poder estar com o a que cheguei.
Indisposto como quando depois de vomitar.
Uma saudade de algo que nunca existiu
Uma esperança de algo que não se cumpre

Findo o dia, permanece o mundo igual
Não mudou nada, as pessoas continuam pessoas
Os deuses continuam deuses
E eu amarrado à condição de ser escravo deles.
Corrói-me isso como um ácido fraco
Que vai corroendo sem doer, e doendo sem sentir
E que de repente sente-se todo duma só vez
e nos derruba como uma verdade absoluta

Não sei mais sobre a vida que a vida sobre si mesma.
Nem mesmo os farrapos que guardo servem para limpar o chão em que piso.
Os dedos dos pés estão gretados de andar tanto ao sol e à chuva
A natureza não os poupou com a erva verde
Lançaram-me pedras para debaixo dos pés descalços
E andei por cima delas sem me importar com isso
Mas agora que parei elas doem como uma dor que não se conhece o nome
E não se pode aliviar porque ela não pode ser contada a ninguém.
Um peso de pedra pesa-me nos pés em chaga.

De que vale caminhar por montes e vales, se se acaba chegando ao mesmo sítio?
De que vale esforçar a voz para gastar as cordas vocais nas suas vibrações?
De que vale tentar caminhar descalço para se chegar mais cheio ao fim,
se no fim todos são iguais, todos desembocam num grande lago profundo
Que ninguém conhece e que ninguém quer conhecer

A esperança também se escondeu na sua toca escura,
e já não volta
O sol não consegue aquecer a água do lago por ser tanta e tão funda
A chuva não consegue encher o lago por ser tão escassa e tão esparsa
O vento não consegue mover a maré, porque não há maré que se queira mover mais
A erva não consegue crescer, nem no fundo do lago, porque não há luz que lá chegue.
E a mim, só me resta afogar-me nesse lago
Já que tudo me escapa e não sei ser essa água que vejo à minha frente
Pode ser que nela me dissolva e esqueça as mentiras que me contaram
E deixe de ter forma que não serve para nada.

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