o mundo já foi dominado pela religião, e depois passou a ser dominado pela economia. Hoje em dia é a informação que nos domina através de estatísticas absurdas.
No tempo da religião ser-nos-ia muito difícil conseguir fazer andar o mundo. Ainda assim, houve muitos que o tentaram e conseguiram, e isso aconteceu exactamente porque tentaram apenas mudar-se a si mesmos. O problema era que o acesso à informação era muito restrito, e isso condicionava a aprendizagem individual.
No tempo da economia, ou antes, no tempo do capitalismo estabelecido, é-nos difícil mudar o mundo, mas já mais fácil que anteriormente, a circulação de pessoas e bens é maior, a competição torna-se mais global e globalizada, é possível chegar a um muito maior número de pessoas. Contudo, quem tem à partida o maior capital consegue estabelecer-se melhor a princípio, e estender a sua influência a maiores domínios, apesar de ser necessário gerir esse capital para continuar a ocupar uma posição influente.
No tempo da informação, já se pode mudar o mundo com mais à-vontade. O número de conexões entre pessoas aumenta, assim como as combinações para a transmissão de informação. Mais pessoas têm acesso à informação, mas esta ainda não está depurada o suficiente para que possa produzir o efeito desejado. Contudo, é pela primeira vez possível atingir de uma só vez uma grande quantidade de alvos, sendo ainda possível chegar, através desses alvos, a terceiros, e assim sucessivamente, numa reacção em cadeia. A velocidade de circulação da informação é grande, e o único revés está, por um lado, quando essa informação é excessiva (apesar de contribuir para a adaptação individual a uma maior taxa de captação de estímulos por intervalo de tempo), por outro quando essa informação não é fidedigna - e daí a necessidade de levar a cabo a depuração dessa informação.
A depuração da informação só poderá ser feita por um processo supra-informativo, isto é, por um processo crítico em que cada pessoa possa, por si própria, reconhecer qual a informação fidedigna e qual a informação que nem merece que a ela lhe seja dado esse nome. Como toda a informação, ou estímulo, é interpretado individualmente como um fenómeno, isto é, como uma situação para si, e não como uma situação em si, só depois de aumentado o grau de consciência de cada um poderemos chegar à verdadeira Depuração, a depuração que consiste em, num plano exclusivamente mental, ou conceptual, excluir aquilo que não é fidedigno, isto é, aquilo que se afasta mais da realidade (forçosamente individual, pois a realidade é aquilo que cada um é capaz de sentir), retendo aquilo que é, de facto, fidedigno, ou que mais se aproxima da realidade. Ora, se a realidade é uma construção humana, uma percepção de um acontecimento, ou seja, se estamos a falar em fenómenos, então só o aumento das capacidades perceptivas (tanto em quantidade como em qualidade) poderá ser a única resposta possível para que possamos fazer andar o mundo para a frente.
Mas precisamos de um método, de um conjunto de passos que nos permita a pouco e pouco abrir as portas da percepção a terrenos que hoje nos são desconhecidos. Como fazer isso? Bem, só podemos ir à luta com os instrumentos de que dispomos, visto que aqueles aos quais não temos acesso nos são inúteis de qualquer forma, ou pelo menos de acordo com a nossa actual condição; assim, utilizando os meios de comunicação, já tão desenvolvidos, de que dispomos, podemos utilizar essa enxurrada informativa a nosso proveito: mesmo esse excesso de informação pode permitir nos seres humanos, a menos que tenha uma natureza monocórdica e repetitiva, um processo de adaptação mais rápido aos estímulos que nos chegam do ambiente que habitamos. Assim, mesmo a profusão a que assistimos de dados informativos, pode desencadear processos adaptativos nos seres humanos que os levam a aprender algo mais rápido e melhor. Claro que tudo dependerá da vontade pessoal em aprender, do trabalho que efectivamente utiliza para aprender e também da sua constituição encefálica, de processos de renovação celular neuronal e de processos de expansão neuronal, e provavelmente de taxas de expressão diferencial de genes. Contemplando o físico, a vontade própria, a chamada energia que canalizamos para realizar esta ou aquela tarefa, e ainda a concretização que levamos a cabo, podemos procurar expandir mais rapidamente as nossas possibilidades humanas, e por conseguinte aumentarmos a nossa consciência, ou ampliarmos a nossa inteligência, que mais não é que a capacidade de nos adaptarmos a novas situações pela resolução de problemas.
Este processo já está ocorrendo, ainda que sub-repticiamente, e tendo como bases elementos cuja natureza é ou pode ser perniciosa, mas não deixa ainda de ser mais uma forma de andar para a frente, possamos então todos nós andar assim, e quem possa andar melhor que o ande, pelo menos poderemos chegar mais depressa à meta quando esse ensejo aparecer diante de nós.
Mas como é que se chega a fazer essa depuração? Captar mais estímulos, seja quantitativa ou qualitativamente não chega se não soubermos distinguir os estímulos que se aproximam mais da verdade e aqueles que dela se afastam mais, se é que algo de verdadeiramente verdadeiro ou realmente real existe. É necessário que cada um faça essa depuração, mas como? Primeiro que tudo é necessário saber reconhecer qual a informação que é fidedigna da que não é. Isso só será possível depois de a mesma pessoa ter sido confrontada com diversos estímulos e ter reconhecido quais aqueles que, para ela, se aproximam mais à realidade e quais aqueles que dela se afastam mais. Terá então essa pessoa que ter recebido muitos estímulos desse tipo, e tantos e em tão variada qualidade e quantidade que possa reconher ela própria, e sem ajuda externa, qual a verdadeira natureza, isto é, de que forma a natureza de algo se aproxima mais ou menos daquilo a que chamamos realidade.
Mas como é que uma pessoa pode distinguir e depurar, por si própria, algo como isso? Ninguém pode ensinar-lhe em que consiste a depuração, apenas através da sua própria aprendizagem ela pode chegar, por si própria, a essa compreensão. O referencial em que cada pessoa se move é o referencial que consiste nela própria, e portanto todas as outras coisas que existem, ou que admitimos que existem, são medidas em função desse referencial. Não podemos deixar de ser o que somos, e portanto não podemos nunca e em situação alguma arrancar esse referencial de nós próprios: a única solução a que podemos consiste em assumir esse referencial na sua totalidade, compreendê-lo, estudá-lo muito bem, todas as suas escalas e números, todas as designações e letras, declives e intersecções. Só depois de ter estudado a fundo o referencial poderemos partir para a comparação com objectos que nos são exteriores: todo o objecto, lembramos mais uma vez, é medido em relação a esse referencial.
Portanto, a questão aqui é ficar a conhecer o seu referencial, e não o de outros, pensar por si próprio, chegar às suas conclusões, cometer os seus erros, cair e levantar-se tantas vezes quantas forem preciso até que não se possa cair mais, e daí até que se levite no ar e nunca mais se volte a pisar o chão. Só neste contexto pode cultivar-se a depuração.
A depuração não é mais que um processo de ajustamento por escolhas, isto é, ele consiste numa compreensão do referencial e no ajustamento dos objectos exteriores ao sujeito ao seu próprio referencial. Os objectos que mais se aproximarem daquilo que é a origem ou cerne do sujeito serão esses os ideiais, talvez se possam adoptar uns e outros que escapem mais ou menos daquilo que o sujeito é, mas não muito mais que isso, e apenas tendo em vista a obtenção de outro objecto que seja ainda mais próximo dessa origem do sujeito, a origem do seu próprio referencial.
Mas escolher implica ter a liberdade de escolher, e onde esta liberdade não existir não é possível depurar coisa nenhuma. A liberdade é a maior qualidade que deve ser cultivada, de ser livre de poder fazer o ajuste que se queira, de ser livre de poder escolher o objecto que se queira. Infelizmente vivemos hoje na era da informação, mas, e em contraponto, a nossa economia ainda se rege por um capitalismo inferior, em que o lucro não é distribuído ou disperso, mas sim concentrado. Esse é o grande problema do capitalismo: o capital não circula senão num círculo fechado que se auto-alimenta, e de tal forma a não permitir a existência de uma verdadeira liberdade individual. Porém, este capitalismo inferior também poderá dar origem a um capitalismo que se possa realmente considerar superior, visto que ultrapassa em muito o âmbito do anterior: um capitalismo em que a circulação de capital seja tão rápida que não seja possível definir nenhum percurso preciso do seu caminho, e esta situação já está acontecendo, embora encontrando sempre uma resistência mais aqui ou mais acolá. Para que essa situação se invertesse, os detentores do maior capital deveriam dispersá-lo o mais possível, para que todos pudessem ter livre acesso a qualquer serviço, bastando para isso desejar tê-lo. O progresso tecnológico tem contribuído para este fluxo de capital, que, na verdade, se anda transformando agora em fluxo de informação, talvez num futuro não tão distante se possa substituir o dinheiro pela palavra, ou pela letra, pela quantidade de informação que um texto comporta, e que é infinitamente maior do que qualquer número seco e engravatado, por mais infinito que seja.
Mas mesmo que o dinheiro passe ao nível da palavra, e a palavra seja a nova transacção mundial, não podemos verbalizar tudo aquilo que desejamos ou sentimos, e portanto também essa transacção, temporária, se revelará insuficiente para cumprir esse desejo de centrar definitivamente todos os referenciais com o nosso próprio. Será necessário sonhar ainda mais além, e quando a informação puder fluir de forma tão espontânea como natural, a palavra dará origem ao pensamento, que é energia pura, seja em gradiente de concentrações ou em gradiente de cargas, mas sobretudo em fluxo de ondas electromagnéticas. A esse nível será possível obter qualquer coisa que seja pelo pensamento, estando ele treinado devidamente e preparado para comandar a mais sofisticada maquinaria que o mundo alguma vez viu, incluído todos esses aparelhos de medição e perscrutadores à nano-escala, quiçá pico-escala ou ainda inferior, que isso só o tempo o poderá dizer.
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