segunda-feira, 31 de março de 2008

WE ARE THE ROBOTS

we are the students
we are the robots
we are the teachers
we are the robots
we are the players
we are the robots
we are the robots
we are the robots

we are the robots
we are the men
we are the robots
we are the women
we are the robots
we are the people
we are the robots
we are the robots
we are the robots

quinta-feira, 27 de março de 2008

quarta-feira, 26 de março de 2008

A incapacidade para estabelecer uma relação interpessoal duradoura reside em traumas afectivos não superados. O importante não é garantir um desenvolvimento afectivo até à idade adulta isento de traumas; na verdade os traumas fazem parte deste próprio processo de desenvolvimento. Assim, uma constituição psíquica que permita o estabelecimento e desenvolvimento de relações interpessoais construtivas não é aquela que não sofreu com os traumas do passado - será possível evitar qualquer trauma? - , mas sim aquela que é capaz de, autonomamente, reconhecer, identificar e aceitar os traumas por que passou. A aceitação é o mecanismo psíquico fundamental e necessário para a plena compreensão da história de vida individual e para o saudável desenrolar do processo de aprendizagem.

Tratado sobre as relações humanas

segunda-feira, 24 de março de 2008

sábado, 22 de março de 2008

Bolero



Les uns et les outres par Maurice Ravel

Para não perder de vista a onda impressionista que tantas vezes surge, e tão comum ao poeta, a impressão das horas que passam, do tempo que fica, enfim, a impressão de que se é um ser, algo único, inexplicável no mundo, aqui fica o magnífico Bolero de Maurice Ravel, música que é conhecidíssima mas que, pese a minha ignorância, que é funda, só descobri há não muito tempo, e pela mão desse Grande Homem que é o Professor Eduardo Crespo. Referia-se o Senhor então a uma questão central da Imunobiologia, a diferenciação do eu em relação ao não-eu, ou a relação do eu com o outro, a dança do um que se faz dois. O como aí está. Enjoy.

o pintor que era poeta

De Tarde

Naquele pique-nique de burguesas,
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.

Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão-de-bico
Um ramalhete rubro de papoulas.

Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampámos, inda o Sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos,
E pão-de-ló molhado em malvasia.

Mas, todo púrpuro a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro das papoulas!


Cesário Verde
c'est
l'impressioniste













Monet

ao que parece o meu corpo não se esquece

inventar pessoa


quarta-feira, 19 de março de 2008

eis a mestria de Cesário Verde

[O Guardador de Rebanhos]


III

Ao entardecer debruçado pela janela,
E sabendo de soslaio que há campos em frente,
Leio até me arderem os olhos
O livro de Cesário Verde.

Que pena que tenho dele! Ele era um camponês
Que andava preso em liberdade pela cidade.
Mas o modo como olhava para as casas,
E o modo como reparava nas ruas,
E a maneira como dava pelas pessoas,
É o de quem olha para as árvores,
E de quem desce os olhos pela estrada por onde vai andando
E anda a reparar nas flores que há pelos campos...

Por isso ele tinha aquela grande tristeza
Que ele nunca disse bem que tinha,
Mas andava na cidade como quem não anda no campo
E triste como esmagar flores em livros
E pôr plantas em jarros...


Alberto Caeiro



Demasiado objectivo? Nunca é demais salutar. Cesário Verde andava olhando para as coisas e reparando realmente nelas. Os outros só reparavam naquilo que queriam ver. Onde uns viam só jornalistas, burguesias e mordomias via o Cesário a rude e graciosa força do campo, a energia sadia que emanava das frontes das mulheres que vendiam hortaliça e fruta. Não admira que tenha sido malquisto na sua altura: ninguém o entendia. Falavam línguas de mundos opostos. Ele, via só o que via. Os outros, viam aquilo que tinham na cabeça. E pior que ver o que tinham na cabeça, eles viam as ideias com que a tinham forrado para deixar de ver. Neste aspecto é Cesário a personificação do filósofo que se liberta do escuro da sua caverna. E não só ele se liberta porque vê: ele procura também libertar os outros, e por isso escreve. Inspiração que dá na alma ou inclinação para as Letras, cumpria-se vendo e escrevendo o que via. Pena é que poucos conseguissem ver a realidade tão bem como ele sobre ela discorria.

Mas nem só de real vive o homem, e Cesário sabia isso muito bem. Contemporâneo das estéticas realistas, Cesário vai beber inspiração nelas para recriar pela palavra o real quotidiano; é contudo mais importante a atitude que o poeta imprime de seguida no cerne desse real observável: a transfiguração imaginadora. Cesário parte do real para transcendê-lo; não o apresenta apenas segundo aquilo que é directamente observável, procura mesmo transformar o comum e o ordinário numa obra de arte, numa fonte de contemplação estética. Assim que um determinado elemento do quotidiano, observável, lhe entra pelos olhos dentro e consegue esbarrar na fronteira entre observado e sonhado, a sua imaginação transmuta a realidade e dá-lhe mesmo a dimensão do sonho. Poder-se-á dizer que a realidade é transmutada, exactamente como num processo alquímico, do mais vil metal para o metal mais precioso; ou que o sonho que vive à larga na imaginação é transposto para esse mesmo real observável, e é na realidade que se cumpre - ainda que apenas no plano conceptual que é o ventre de todos os ideais. Tais elementos não são comuns a um paradigma estético como o do Realismo: para os realistas, só aquilo que é directamente observável, ou do qual se pode ter experiência directa pelos cinco sentidos exteriores, importa contemplar. Assim, Cesário abrange não só o seu paradigma estético incluindo elementos marcadamente impressionistas - e impressionistas aqui enquanto derivantes da impressão subjectiva e individual, única, da imaginação do poeta - como também o paradigma estético vigente naquilo que ao poeta era contemporâneo. Cesário mostra-se, portanto, tão homem do seu presente - o observável - como do futuro - a imaginação - , e transcende tanto no plano literário como no plano da sua própria vida física os cânones que limitam cada indivíduo a expressar-se do melhor modo que se acha seu em cada momento.

terça-feira, 18 de março de 2008

Estatística

Quando eu nasci havia em Portugal
(em Portugal continental
e nas ridentes,
verdes e calmas
ilhas adjacentes)
uns seis milhões e tantas mil almas.
Assim se lia
no meu livrinho de Corografia
de António Eusébio de Morais Soajos.
Hoje, graças aos progressos da Higiene e da Pedagogia,
já somos quase dez milhões de gajos.

António Gedeão



de-li-ci-o-so este poema. E é tudo verdade nele. Só é pena que sejamos cada vez mais hoje apenas uns dez milhões de gajos, e não as pessoas singulares e únicas que nascemos...
em expressando-te sê geómetra.
unir o que é avesso: eis aqui a minha missão.

domingo, 16 de março de 2008

Exegese pessoana

Ainda estamos muito longe de conhecer Pessoa se continuarmos a querer analisar os seus poemas de um ponto de vista meramente literário. Diz-se meramente não para menosprezar esse ponto de vista que nasce da crítica literária aos próprios textos que Pessoa escreveu, mas antes para menosprezar a atitude extremamente redutora que alguns críticos têm quando reduzem a vida e, enfim - também podemos dizer - , a obra do poeta àquilo que o próprio poeta escreveu. Continuaremos a não compreender Pessoa se não olharmos com cuidado, com um olhar demorado e crítico, para as circunstâncias históricas que o cercaram e para - sobretudo - a sua própria história de vida. Não há nada de mais errado em analisar a obra de Caeiro, por exemplo, seguindo todos os textos que ele escreveu. E é errado porque entre alguns desses textos escreveu Reis e escreveu Campos e etc. outros textos que, cronologicamente dispostos, permitem ter - aí, sim! - uma visão histórica, evolutiva, do desenvolvimento mental, ou psicológico, do nosso Pessoa. Só quando nos deparamos com pequenas excepções - a do "dia triunfal" de Pessoa, como ele próprio o chamou - , ou seja, quando a escritura dos poemas segue realmente uma ordem cronológica, é que podemos pensar em encontrar alguma linha de orientação, algum fio condutor, alguma verdadeira análise, crítica e interpretação significante daquilo que julgamos ter sido Pessoa segundo os critérios que hoje usamos. Agostinho da Silva clarificou um ponto que nos parece ser extremamente importante: podemos traçar a psicologia - e os textos - dos heterónimos de Pessoa, em todas as suas multiplicidades; mas não podemos ainda, contudo, ter uma ideia clara e bem definida de quem foi, na realidade, Fernando Pessoa - esse Fernando Pessoa que se movia pelas ruas de Lisboa e que escreveu tantos textos que hoje podemos contemplar e saudar à vontade. Assim, e no sentido de resolver esta questão, propõe-se o seguinte: uma vez inventariados todos os poemas de Pessoa, ponham-se os textos todos por ordem cronológica. É certo que muitos deles são dispersos, que podem não ter data, e que podem até mesmo ter atribuição incerta a um ou a outro heterónimo; mas ainda assim, daqueles que se conhece alguma coisa, trate-se de ordenar aquilo que eles são. Procure-se Pessoa de acordo com a inspiração que lhe batia em cada instante. Tente-se reconstruir o que terá sido a vida de Pessoa - coisa que, num rigor científico, nos não é possível fazer - , mas pelo menos a partir da ordem pela qual os poemas nasceram em si (ou desceram até si). Independentemente da sua origem ortónima, heterónima ou semi-heterónima. É preciso uma verdadeira exegese pessoana.
escrever à máquina é para mim falar

Fernando Pessoa, na famosa carta a Adolfo Casais Monteiro



e o que faria Pessoa se lhe dessem um computador?

sábado, 15 de março de 2008

Obra poética de António Gedeão



António Gedeão tem muita porcaria nos poemas que escreveu. Às vezes são poemas inteiros, em que se discorre sem se dizer nada, ou apenas repisando o já repisado; e por vezes certos versos, certas passagens de um encanto miraculoso surgem a afastar as sombras tenebrosas da razão que teimosamente aflora a sua imaginação poética. Os poemas que são todos lixos à excepção destes pequenos e precisos rasgos de génio não podem ser considerados os seus melhores poemas, apenas podem ser considerados os poemas que têm os melhores versos, os melhores rasgos ou as melhores centelhas de génio. Os melhores poemas de António Gedeão são aqueles em que a força da crítica brota com mais à-vontade, ou em que uma razão organizadora e intelectualizante torna claríssima, por vezes mesmo científica - como a dos dicionários - e cientificamente esclarecedora, a realidade, como em "Hora H". O ritmo assume um papel preponderante na sua Poética. António Gedeão não seria António Gedeão se não tivesse o ritmo magnífico que o poeta lhe imprime nas doses compassadas de uma "Calçada de Carriche" ou de um "Poema de pedra lioz". Fortemente vincados são os seus assomos periódicos de uma descrença no progresso e esclarecimento da humanidade como um todo, que desemboca por vezes até na descrença de um futuro para a humanidade. Estes sentimentos disfóricos são, em alguns casos, transmutados na linguagem poética - ora com mais raiva, ora com mais sentimento - para uma pulsação vibrante que eleva a sua condição e mesmo a transcende, como no "Poema do poste com flores amarelas". A amargura, porém, ressalta em fortes impressões disfóricas e marca uma presença constante - apenas por vezes superada por meio dessa transcensão - em toda a obra: "Poema da mulher dos cabelos brancos", "Poema do gato", "Poema do autocarro", "Poema do homem só", etc. O sentido crítico apurado de António Gedeão escolhe por vezes brincar com o lado cómico dos episódios que constituem o teatro da humanidade, e a sua mestria em exortar e engrandecer ilustres figuras para depois os ridicularizar no cerne da sua própria condição é uma das suas características mais vincadas, e bem presentes nos prazenteiros "Poema do fecho éclair", "Dia de Natal" e "Estatística". Mais importante do que o seu cepticismo face à religião (com referências cristãs, como em "Dia de Natal") e a sistemas esotéricos (e.g. alquimia, em "Poema do alquimista"), é a sua capacidade especulativa acerca do modo como cada ser percepciona o mundo e estabelece o que é e não é real para si (ver "Impressão digital"), a impossibilidade de atingir uma compreensão e um conhecimento verdadeiros acerca daquilo que existe e a que chamamos mundo (ver "Forma de inocência"), a importância do sonho como fonte, causa e fundamento da existência humana (ver "Pedra Filosofal"), a importância de manter em si a criança rebelde e indisciplinada que é a mãe da imaginação criadora e a sua relação com um mundo que lhe é exterior e que procura contê-la e discipliná-la, num jogo de tensões entre contrários inconciliáveis (ver "Autobiografia"), outro jogo de forças que existe entre a esperança do poeta na evolução da humanidade e a realidade esmagadora e opressora de toda a liberdade (ver "Poema do autocarro"), a procura de uma comunhão com outros homens e o questionamento acerca da validade que poderá ter ousar levar a cabo essa árdua tarefa (ver "Poema dos homens distantes") e, finalmente, mas não menos importante, uma sempre constante tentativa de imaginar o mundo como será num futuro em que o poeta não o poderá viver enquanto homem que resulta, muitas vezes, numa visão de um futuro sem esperança (ver "Poema da buganvília", "Poema do alegre desespero") ou onde, por outro lado, apenas uma pequena e ténue esperança raia num horizonte incerto e difuso (ver "Poema do eterno retorno"). Ainda assim, a maior mestria de António Gedeão talvez seja mesmo o dom que tem de fundir ciência e arte, ou mesmo ciência e história, com um cuidado que pode mesmo ser considerado pedagógico. Grande virtude esta, e tão actual e necessária nos dias que correm, de fundir e conciliar os princípios que à primeira vista parecem mais contraditórios que complementares. António Gedeão consegue fazer a síntese deste conhecimento e brilhar como nenhum poeta nos seus magníficos "Pedra filosofal", "Lágrima de preta" e "Lição sobre a água". É impossível ficar indiferente à profunda força que anima o seu discurso poético, especialmente quando o ritmo tão vincado e tão importante neste contexto demarca a sua poesia em todo o seu fulgor, beleza e irradiância. António Gedeão tornou-se o poeta científico mais importante do nosso tempo e seduziu-nos nos seus ritmos musicais com tal intensidade que conquistou para sempre um lugar no coração de todos os homens. Urge conhecer a vida e obra deste cientista feito poeta para que com ele possamos aprender como casar arte e ciência e dar à luz o século XXI de que o nosso mundo precisa. Haja vontade.

OS MELHORES POEMAS

OS MELHORES POEMAS de António Gedeão são,
por ordem de aparição:

Movimento Perpétuo (1956)
- Impressão digital
- Forma de inocência
- Gota de água
- Pedra Filosofal

Teatro do Mundo (1958)
- Poema do homem só
- Autobiografia
- Poema de pedra lioz
- Calçada de Carriche

Máquina de Fogo (1961)
- Dia de Natal
- Lágrima de preta
- Poema do autocarro
- Poema da auto-estrada

Linhas de Força (1967)
- Lição sobre a água
- Poema do fecho éclair
- Poema da buganvília
- Poema da flor proibida
- Poema da morte na estrada
- Poema dos passarinhos antigos
- Poema da terra adubada
- Poema do poste com flores amarelas
- Poema do alegre desespero
- Poema da morte aparente
- Hora H

4 Poemas da gaveta
- Estatística

Poemas Póstumos (1983)
-

Novos Poemas Póstumos (1990)
- Poema da mulher dos cabelos brancos
- Poema dos homens distantes
- Poema do gato
- Poema do eterno retorno

Poema do autocarro

Quantos biliões de homens! Quando gritos
de pânico terror!
Quantos ventres aflitos!
Quantos milhões de litros
do movediço amor!
Quantos!
Quantas revoluções na cósmica viagem!
Quantos deuses erguidos! Quantos ídolos de barro!
Quantos!
Até eu estar aqui nesta paragem
à espera do autocarro.

E aqui estou, realmente.
Aqui estou encharcado em sangue de inocente,
no sangue dos homens que matei,
no sangue dos impérios que fiz e que desfiz,
no sangue do que sei e que não sei,
no sangue do que quis e que não quis.
Sangue.
Sangue.
Sangue.
Sangue.

Amanhã, talvez nesta paragem de autocarro,
numa hora qualquer, H ou F ou G,
uns homens hão-de vir cheios de medo e sede
e me hão-de fuzilar aqui contra a parede,
e eu nem sequer perguntarei porquê.

"Mas..."

Não há mas.
Todos temos culpa, e a nossa culpa é mortal.

"Mas eu só faço o bem, eu só desejo o bem,
o bem universal,
sem distinguir ninguém."

Todos temos culpa, e a nossa culpa é mortal.
Eles virão e eu morrerei sem lhes pedir socorro
e sem lhes perguntar porque maltratam.
Eu sei porque é que morro.
Eles é que não sabem porque matam.

Eles são pedras roladas no caos,
são ecos longínquos num búzio de sons.
Os homens nascem maus.
Nós é que havemos de fazê-los bons.

Procuro um rosto neste pequeno mundo do autocarro,
um rosto onde possa descansar os olhos olhando,
um rosto como um gesto suspenso
que me estivesse esperando.
Mas o rosto não existe. Existem caras,
caras triunfantes de vícios,
soberbamente ignaras
com desvergonhas dissimuladas nos interstícios.
O rosto não existe.

"Procura-o."

Não existe.

"Procura-o.
Procura-o como a garganta do emparedado
procura o ar;
como os dedos do homem afogado
buscam a tábua para se agarrar."

Não existe.

"Vês aquele par sentado além ao fundo?
Vês?
Alheio a tudo quanto vai pelo mundo,
simboliza o amor.
Podia o céu ruir e a terra abrir-se,
um chuva de lodo e sangue arrasar tudo
que eles continuariam a sorrir-se.
Não crês no amor?"

?

"Não ouves?"

?

"Não crês no amor?"

Cala-te estupor.

Tenho vergonha de existir.
Vergonha de aqui estar simplesmente pensando,
colaborando
sem resistir.

Disso, e do resto.
Vergonha de sorrir para quem detesto,
de responder pois é
quando não é.
Vergonha de me ofenderem,
Vergonha de me explorarem,
Vergonha de me enganarem,
de me comprarem,
de me venderem.

Homens que nunca vi anseiam por resolver o meu problema concreto.
Oferecem-me automóveis, frigoríficos, aparelhos de televisão.
É só estender a mão
e aceitar o prospecto.
A vida é bela. Eu é que devia ser banido,
expulso da sociedade para que a não prejudique.
Hã?
Ah! Desculpe. Estava distraído.
Um de quinze tostões. Campo de Ourique.


António Gedeão

sexta-feira, 14 de março de 2008

e um dia vais ser tu, um homem como tu



os fabulosos Ornatos Violeta ...saudade



Para nos lembrar que o Amor é uma doença

Em que nele julgamos ver a nossa cura.

se não tem tempo livre, o homem não pode exercer a sua mais alta e nobre capacidade: criar.
a literatura nasceu no preciso momento em que alguém se sentiu descontente com a vida neste mundo. Todo o escritor é um eremita da modernidade. O escritor recolhe-se do contacto com outras pessoas porque as despreza, ou então porque está profundamente descontente com elas. A literatura consiste num escape à realidade porque permite que a mente esteja voltada para si mesma; ela permite que a mente se dedique exclusivamente ao acto de criar, e à imaginação, que é a mãe da criação. Assim, todas as verdadeiras obras literárias são uma tentativa de elevação; uma elevação individual porque permitem ao escritor desprender-se das amarras históricas que o prendem com severidade; uma elevação colectiva porque, ao serem lidas por qualquer pessoa que as saiba entender, podem lançar a humanidade num outro nível de consciência que lhes permita também libertar-se das deformidades históricas - e sobretudo sociais - em que vivem. A função da literatura é, assim, libertar; e nós podemos ver isso analisando as várias obras que foram escritas ao longo da história: as que mais libertaram - as amarras da mente como as amarras do corpo - foram aquelas que maior agitação social causaram, exactamente porque eram as mais livres de deformidades, e que portanto mais entravam em conflito com as deformidades existentes.
ignorantes são as pessoas que se fecham à novidade.
a ignorância das pessoas é um poço sem fundo.
toda a literatura é uma fuga à condição abjecta em que nascemos.

quinta-feira, 13 de março de 2008

a imaginação à solta














à mais bela série de televisão jamais feita...
engraçado o modo
como as coisas são
hoje bem percebo
o que ontem não

quarta-feira, 12 de março de 2008

o amor é sublimemente natural. Amamos tudo e amamos ninguém sem nos importar com isso. Na escolha do objecto do nosso amor não podemos ter rédea alguma: é totalmente visceral e inconsciente o desejo que anima esse movimento, seja ele meridional ou setentrional. A razão não pode nada contra ou a favor do amor; o amor é, pela sua própria natureza, irracional (e talvez seja melhor dizê-lo antes arracional, já que ele não escolhe ser o contrário da razão mas, sendo superior a esta e não estando dentro do domínio da sua esfera de acção, é simplesmente algo diferente, incomensurável mesmo, quanto à sua natureza). E aqui é que se torna importante distinguir o amor da relação.

O amor existe por si, somente por si próprio, e independentemente de qualquer relação que se possa estabelecer. São as pessoas que estabelecem as relações, e como todas as coisas que são geradas pelas pessoas, as relações estão sujeitas aos constrangimentos do tempo e do espaço que vigoram no mundo em que vivemos. E exactamente porque estão sujeitas a esses constrangimentos, seguem o fim inexorável de todas as coisas: a desagregação. Sendo a relação algo que foi gerado, sendo portanto alguma espécie de contrato social que foi celebrado entre pessoas que se encontram a viver numa dada sociedade para benefício mútuo e próprio, então é inevitável que esse contrato, enquanto algo material - enquanto algo que é material na sua substância, digamos assim - , se desagregue como acontece com qualquer outro objecto cuja existência é exclusivamente material.

Um exemplo bastante claro da diferença que existe entre amor e relação é o existirem pessoas que se amam mesmo encontrando-se separadas por uma grande distância - física - entre si. Os constrangimentos espácio-temporais não podem diminuir ou aumentar o amor que essas duas pessoas sentem entre si, se ele existe; o amor tem, portanto, uma substância que está acima desses constrangimentos. Mas esses mesmos constrangimentos espácio-temporais podem condenar a relação entre essas duas pessoas, já que a relação é algo material que se constrói entre duas pessoas e que tem que ver com a organização do seu espaço e do seu tempo - ambos materiais - às contigências de uma vida conjunta. Não é possível desenvolver ou construir sequer uma relação se essas duas pessoas não vivem uma vida conjunta, isto é, se não habitam a mesma casa, ou se não se vêem frequentemente; em suma, se não concretizam o amor que sentem em algo material ou físico. A impossibilidade de concretização de um ideal, seja ele qual for, acarreta na alma humana uma grande angústia, pois priva o corpo - a parte daquilo que somos que sentimos como mais real - da consagração de toda a plenitude que o amor puramente espiritual - da alma - permite experienciar.

Por um lado, a contemplação que o amor puramente espiritual proporciona é suficiente para que se viva uma vida muito rica, pese embora a grande angústia que uma situação como essa provoca na alma devido à ausência de concretização. Por outro lado, essa mesma concretização do amor na relação - qualquer que seja o seu tipo - não traz um verdadeiro sentimento de completude: se é verdade que sara muitas das angústias da alma, não é menos verdade que introduz outras de ainda mais difícil resolução. As angústias da alma que derivam da não concretização do amor são saradas, é certo; mas é preciso notar que a concretização do amor, enquanto acto físico, está não menos sujeito às constrições espácio-temporais do que um qualquer tipo de relação. Assim, e ao contrário da contemplação do amor puramente espiritual - cuja substância é imperecível - , a concretização do amor enquanto acto físico tem uma natureza perecível, ou finita. É por essa razão que traz novas e mais fortes angústias à alma: qualquer concretização do amor terá um início e um fim, visto que, enquanto objecto puramente físico, está, como todos os objectos físicos, sujeita à desagregação. A angústia que nasce na alma e que deriva da inexistência de concretização do amor dá lugar então a uma angústia - ainda mais intensa - que deriva da constatação da impossibilidade de concretização imperecível do amor puramente espiritual. Perante esta escolha - entre a contemplação do amor puramente espiritual e a concretização material do amor puramente espiritual - , escolha esta que todos nós somos obrigados a fazer, só poderá surgir como sensato escolher a contemplação do amor puramente espiritual. Na verdade, entre escolher uma angústia da alma suave (ou suportável) ou uma que nos atormenta muitas vezes mais (e que pode chegar ao ponto de se tornar insuportável), o caminho mais sensato a seguir é aquele que nos leva à maior realização pessoal, e portanto à completude, mesmo se com isso temos que carregar a cruz da não concretização do amor puramente espiritual.

Como as diferenças entre a contemplação puramente espiritual do amor e a concretização material desse amor nos permitem explanar qual a diferença de qualidade entre o amor e a relação, pode-se notar ainda outro corolário desta exposição: a relação - seja de que tipo for - , exactamente por ser a concretização material e finita do amor puramente espiritual, está também condenada à desagregação. Assim, a manutenção indefinida de qualquer relação entre duas pessoas não é natural; é mesmo contrária à própria natureza dos objectos materiais (que estão sujeitos à desagregação). Assim, como se explica a existência dos casamentos, mesmo sabendo que a sua natureza finita - pois que de um tipo de relação se trata - os conduz inexoravelmente à desagregação? Só podemos explicar este tipo excepcional de relação se considerarmos a existência de contratos sociais: cada uma das partes envolvidas neste contrato abdica de uma porção da sua liberdade individual para tornar essa relação o mais duradoura possível (e é necessário lembrar que nem mesmo neste caso se pode dizer que a relação superou os constrangimentos espácio-temporais: a morte física põe fim a qualquer tipo de relação que possamos estabelecer em vida).


Tratado sobre as relações humanas
o amor existe; o que não existe são as relações.

terça-feira, 11 de março de 2008

Desassossego-me
com o coração.
Não uso a razão.

A razão embota,
a essência esquece.
Tudo se esgota -
adormece.

Entre o muro que há
e o que não volta,
vemos o outro lado:
nossa vitória é
ser tudo estrago.
a pele esfola-me como um vagão, a luz mortiça das horas cálidas faz o coração estremecer entre centelhas milenares, as mãos de tanto escrever estão gastas como o tempo de quem já se esqueceu, a música perdeu o seu brilho no olhar de quem o não teve, os pés pedem mais estradas e mais caminhos que não se conhecem para pisar, os músculos contraem-se e distendem-se da sua maneira tão própria e impelem o corpo mais além, prestes a sair de onde nunca se esteve. A vida podia resumir-se a isto: um livro vazio, uma caneta que falha na hora certa, uma conversa perdida na gaveta. A vida é o desencontro dos encontrados, o encontro dos desencontrados, as malhas que o destino tece e que nos enredam na nossa própria exisência. A soma de enganos e desenganos a que nos submetemos quando, no preciso e extremo instante, neste mesmo, nos decidimos a não nos suicidar revelam-se e desvelam-se continuamente numa sucessão vertiginosa de espigões em brasa e lutas incandescentes. O tempo passa, desgasta. O espaço oprime, comprime. A luz que vemos, de tão forte parece baça. O saber, se ele existe, de nós desiste.

não adormeci o meu vício de ti



Mesa
Bem gostaria de saber para quando o senhor Filipe La Feria nos reserva um musical onde se possa realmente aprender alguma coisa.

E para não dizerem que aqui só se reitera a maledicência, proclama-se:

E porque não adaptar o musical "HAIR" para um palco português?

Está lançado o repto, e agora se houver alguém com capacidade para fazê-lo que o faça!

livros são papéis pintados com tinta

segunda-feira, 10 de março de 2008

a liberdade saiu à rua, e estava nua

Let the sunshine in



para provar que há coisas que não estão sujeitas às leis do tempo e do espaço, mas que vivem simplesmente, para sempre.
Comparado com o dois, trezentos faz um figurão, mas se as unidades de um dois forem suficientemente grandes metem-se dentro do trezentos e rebentam com ele. O inverso também é verdade. Têm-se visto muitos três estoirar com dois e acabarem em um, ou em zero.

Ernesto Sampaio
a arte do escritor consiste em transformar a mais dura pedra e a mais viscosa lama no elixir da vida eterna.

HAVIA UMA SIBILA ANTIGA

HAVIA UMA SIBILA ANTIGA que profetizara em tom incerto: Um dia hei-de vos vomitar em cima, e vós ireis gostar de vos banhar na lama podre e fétida com que irrompo em chamas. E antes de desaparecer, cada átomo da Sibila se converteu em borboletas cor-de-fogo e um grande fumo envolveu toda a clareira. Cheirava ao fumo que antecede a alva da antemanhã.
a verdadeira escrita irrompe por jactos, e é por isso que lhe chamam jactância.

Ode ao Pedro Nunes

por vezes reparo em coincidências terríveis que o mundo me põe mesmo à frente dos olhos, e que estão aí à frente de todos os que os souberem usar: este Sábado foi a grande manifestação, não só grande por ter levado tanto professor descontente a manifestar-se junto ao grandioso Terreiro do Paço - e que belo espectáculo deve ter sido aquele - , mas sobretudo porque é feito em justo acto de defesa contra as políticas economicistas e caducas de uma mulher que nem tem cara para que lhe chamem de ministra. A nossa sinistra (chamar-lhe-emos sinistra em vez de ministra porque é um nome que lhe assenta mesmo bem, e fazendo a devida vénia ao nosso caríssimo colaborador mental Kaosinthegarden que tantas e boas gargalhadas nos proporciona todos os dias, e especialmente em relação a esta triste figura), dizia eu, a nossa boa e bela sinistra, qual bruxa disfarçada de fada de encantar, permanece estoicamente - que digo eu?! Permanece que nem esqueleto sem músculos, que nem marioneta sem titereiro, que nem corpo sem alma - e permanece sempre no lugar onde a puseram, pronta a arrasar com o que resta da educação em Portugal. Querem formar bons autómatos lusos, e visto que a nossa manif, a nossa e a de todos nós, portugueses, os verdadeiros lusos; visto que essa manif atingiu proporções gigantescas (e de tal modo assim foi que nem mesmo um cego-surdo-mudo pôde ficar indiferente), logo tratou o nosso serviço de televisão pública pela mão da RTP1 de nos presentear hoje, Domingo, com um belo programa sobre o Liceu Pedro Nunes. Olhem só que maravilha, tanta gente famosa que por ali passou! Olha o Daniel Sampaio, o Luis Represas, o Nuno Crato, a Ana Zanatti, o João Caraça. Caraças, pá! Parece que para se ser alguém na vida é preciso ter andado no Liceu Pedro Nunes, ou no Liceu Camões, ou no Liceu Passos Manuel. É tão bela a educação em Portugal! Não há ninguém que esteja descontente! Temos a melhor educação do mundo e arredores! Os alunos do Pedro Nunes têm à sua disposição tanto, tanto, tanto! Têm aulas de pintura e de teatro, têm cinema e têm orfeão, têm muita música e salas, salões de baile, salões de concerto, têm até professores que estudam no estrangeiro - ah, que divina virtude, que supremíssima e magnânima felicidade estudar fora do país onde se nasceu e tornar a ele qual filho pródigo - , têm professores que são para os alunos os seus melhores amigos, ninguém se trata mal ou se zanga, ninguém manifesta desagrado, ninguém suspira de perdição ou de fraqueza: tudo é belo e bom, tudo é cultura, tudo é sarau, tudo é sessão, tudo é poesia e poeta, tudo é ginástica e arte, tudo é a suprema felicidade de quem já nasceu com tudo e não teve nada mais do que aquilo a que tem direito e que sempre teve, por entre os anos, por entre os séculos, por entre as árvores genealógicas, por entre e por dentro de tudo e de todos, Tudo É Igual E O Mesmo Ideal! A manifestação dos professores não pesa nada porque era de alegria! Nascem filhós nas pedras da calçada! E o Tejo é uma calda de açúcar! Grande Portugal! Viva, Viva, Viva!

Fora do Liceu Pedro Nunes, fora do Liceu Camões, fora do Liceu Passos Manuel, fora do Colégio Luso-Francês, fora do Colégio Luso-Alemão, fora do Colégio Luso-Chinês, fora do Colégio Luso-Britânico, fora do Colégio Militar-e-Demente, fora do Cu-Légio e do Cu-Régio, fora desses e de todos os outros pedincham moribundos quintiliões, quatriliões, triliões, biliões, milhões e milhares de escolas de segunda, terceira, quarta e quinta categoria de quem não reza a história. O Fernando Rosas não andou lá. O Presidente da República nunca cortou lá uma fita. A Ministra da Educação nunca deu lá um peido. E, portanto, conclui-se facilmente que tudo o resto não é nada. Pena é que o resto seja, afinal, tudo. Enquanto não levarmos a instrução a todas as escolas não haverá nada, e continuará a não haver nada. Enquanto houver um aluno que não puder aprender teatro não descansaremos. Enquanto houver um aluno que não puder aprender a tocar um instrumento não descansaremos. Enquanto houver um aluno que não puder aprender cantar não descansaremos. Enquanto houver um aluno que queira concretizar a sua liberdade de alguma maneira e isso lhe for negado pela instituição que o deveria livremente instruir segundo a sua vontade, não descansaremos; e não nos cansaremos de deitar abaixo todos os muros do medo, todos os muros da ignorância, todos os muros da falsidade e da hipocrisia; não nos cansaremos de deitar abaixo a poeira com que nos querem cegar os olhos; não nos cansaremos de destruir as cátedras e os doutores; não nos cansaremos de deitar abaixo as paredes do Liceu Pedro Nunes para que o Liceu Pedro Nunes seja o mundo inteiro, e para que todos possam ter acesso livre e segundo a sua vontade àquilo que ciosamente se enclausura, se oprime e se comprime em liceus etiquetados. Abaixo o Pedro Nunes! Abaixo o Camões! Abaixo as paredes com que nos querem asfixiar! Nunca e jamais nos renderemos de acreditar.
os beijos técnicos televisivos são das coisas mais ridículas que há. Não há neles um gesto que possa revelar alguma autenticidade, nem sequer da mais caduca. Ou é o rapazote que se afiambra demasiado, enrolado na sua própria gula adolescente, e mete mais a língua dentro desse receptáculo cândido e escorregadio que depressa que fecha e se afasta, ou é o rapazito tímido que não consegue chegar o seu linguado ao vaso de receber da donzela, que anseia sofregamente por essa água de pecado que lhe queima com ardor. Na verdade, os únicos beijos que podem merecer menção de tal título devem mesmo ser os beijos homossexuais que tão levemente são escamoteados das puritanas almas portuguesas. Felizmente para esses já fez a publicidade e também a televisão a multiplicação dos pães e a transformação das águas de cada lar português em vinho: como o que escandaliza mais, o que causa sensação, por mais mesquinha que seja, por mais aviltante ou debochada, é aquilo que dá mais dinheiro, então até esses podem estar descansados nos seus beijos técnicos e desfigurados, na desmembração do amor, na fraude das amizades que não existem, dos amantes que não existem, na grande contemplação da Grande Ausência Individual, a perversão dos nossos tempos que é natural a cada um...

domingo, 9 de março de 2008

ser português é procrastinar-se.

quem foi Kantor?


quarta-feira, 5 de março de 2008

[EntrAvistAdor:] Mensagem para as novas gerações?
[Luiz Pacheco:] Puta que os pariu!

O Crocodilo Que Voa. Entrevistas a Luiz Pacheco, organização de João Pedro George, Tinta da China
os conselhos não valem absolutamente nada neste mundo. Só dá conselhos quem não faz mais nada na vida; se esses fizessem alguma coisa de interessante para a humanidade estariam era vivendo, e não dando conselhos. No viver é que as coisas se cumprem. Todas as ideias são tão ocas por dentro como o são por fora - o que interessa é passá-las à prática, concretizá-las na realidade de todos os dias. O homem superior não precisa de dar nem de receber conselhos para nada: ele próprio, ele próprio e a sua vida, são o melhor conselho que ele pode dar; e mais que conselho é mil vezes maior e mais interessante o exemplo que se é ao viver na vida os conselhos que se poderiam dar aos outros. Os outros têm os seus caminhos, e que temos nós com isso? Cada um vive conforme pode.

terça-feira, 4 de março de 2008

diz-me cá,
diz-me lá,
o que será
que será
que leva
o infinito
a mover-se
p'ra lá?

p'ra lá,
p'ra cá,
tanto faz
se recomeça
o que leva
o infinito
a fazer-me
sua peça?
Deu-nos Deus o tempo e o espaço como grandes lições de quem ensina a ver. O espaço todo, na imensidão da terra que pisamos, para que nos lembremos de que para além do chão onde nascemos e por onde fomos paridos muita mais terra há para pisar em vida; o espaço todo, na imensidão da terra que há debaixo das águas, para que nos lembremos que a maior parte dessa terra que há está escondida dos nossos olhos, e que só depois de usarmos da Ciência a poderemos alcançar; o espaço todo, na imensidão do universo que há para além de nós, para que nos lembremos que nem o espaço que vemos nem o espaço que não vemos completam o todo, e que esse todo que existe é um espaço que ultrapassa a capacidade de nossos passos. Deu-nos Deus o tempo todo, no instante em que nascemos, para que nos lembremos de que é de um instante que se insufla a vida e que em todos os instantes ela pode voltar a ser insuflada; o tempo todo, na sucessão de instantes em que vivemos, para que nos lembremos que em cada instante temos em nossas mãos a escolha de insuflar também a vida ou escoá-la e que são os resultados dessas escolhas finitas que definem a vida temporal que havemos de levar; o tempo todo, no instante em que damos o último sopro, para que nos lembremos de que é também de um instante que se apaga a vida e que este empréstimo que nos foi concedido tem seu prazo de validade na hora do ajuste de contas. E olhai a grande dádiva que foi esta criação de Deus: depois de nossa queda do Paraíso Celestial e da cegueira a que nos submetemos por vontade das imperfeições que gerámos na alma, deu-nos Deus o Tempo e o Espaço em toda a sua imensidão, e acorrentou-nos a ambos, para que soubéssemos carregá-los como Cristo carregou a sua Cruz e, por nossa vontade, a levássemos ao Calvário da Eternidade, que é a casa e o trono do próprio Deus, e nela nos despojarmos das roupagens com que nos vestimos. É grande esta honra em carregar tão pesada Cruz e em subir tão íngremes degraus, pois que a cada passada o Tempo e o Espaço se mortificam em nós e se vão esvanescendo até que alcancemos o Reino de Deus. Porque não podem então o Tempo e o Espaço com as leis da própria Eternidade, que é a casa de Deus? Porque o Tempo e o Espaço foram dados ao homem como carapaça de seu corpo, e por isso a sua acção está limitada ao mundo físico que podemos observar. Longe deste nosso mundo físico com que olhos nos olham e com que olhamos com nossos olhos está o mundo do espírito, que é a casa de Deus; a essa casa não pode ir passo nenhum, e nem instante floresce ou desabrocha; tudo é eterno ao mesmo tempo - e esses olhos com que olhámos o mundo físico não podem suster a visão da Eternidade: só os olhos da inteligência, os olhos do verdadeiro intelecto da alma, podem contemplar a visão da infinita Casa de Deus.



Sermão do Tempo e do Espaço

Homens do século XXI

(e talvez dos séculos que ainda estão por vir...)

Agostinho da Silva
Boris Vian
Fernando Pessoa
Leonardo Da Vinci
Mozart
Platão


Porque é que só são incluídos aqui estes? Olha, primeiro porque agora não me lembro de mais, e cada um se vai lembrando do que pode conforme as suas posses; e depois porque estamos a falar de homens dos séculos que ainda estão por vir, e como sabemos o que irá estar em causa nos próximos séculos - e que começa a despontar agora neste nosso novo século XXI - é a capacidade de um só homem, uma só pessoa, um só ser completamente único e fantástico e diferente de todos os demais conseguir, em si mesmo, concentrar os mais variados, distintos e contraditórios saberes e, não contente com isso apenas, reunir todos no seu entendimento para que possa expressar em plena liberdade a ideia que lhe aparece em cada momento. E essa é que vai ser a educação - educação não, perdão, a INSTRUÇÃO - do Futuro, a verdadeira maneira de viver a cultura como tanto português ao longo dos tempos já sonhou para o Portugal.

segunda-feira, 3 de março de 2008

Como escolher os filmes que vale a pena ter:

o único critério verdadeiramente interessante e válido para justificar a compra de um qualquer filme ou série consiste em escolher apenas os objectos de arte que, por mais vistos ou revistos que sejam, nunca percam em si o seu valor e em nós o nosso interesse. A única coisa pela qual vale a pena lutar é a perpetuação do espanto que surge no prazer em descobrir.


O único senão está no desconhecermos um objecto de arte e não sabermos se ele vale realmente a pena. Assim, propõe-se aqui que se procure primeiro conhecer o homem ou mulher que dá vida a esse objecto de cultura; se ele ou ela for realmente interessante, então será uma boa aposta comprar aquilo que ele produz como objecto de cultura.

E como também há excepções a essa regra, e aqui não nos referimos à comum fatalidade de um homem ser muito mais do que a sua obra, resolvam-se as dúvidas da seguinte maneira: consuma-se o que se tiver que consumir, de forma indiscriminada, ou à luz do que a nossa intuição ou sensibilidade nos dizem, ou até da sensibilidade daqueles que realmente a têm, e só depois então se proceda à compra.

Elevem-se os padrões de exigência.

Não queremos aqui mais matracas como o Saramago que dizem a mesma coisa over and over again nos seus romances: queremos a pura espontaneidade, a liberdade dum Luiz Pacheco, a imaginação dum Italo Calvino, o surrealismo dum Ionesco, a cagança dum Cesariny.
o tempo livre é a maior bênção que o homem livre pode ter.