terça-feira, 23 de janeiro de 2007

a poesia não é prosa. É ritmo, por vezes alucinante, racionalização de sentimento sentido, emoção de pensamento racionalizado. A poesia é espontaneidade. Camões não era nenhum metrómono, nem matemático. Ele ouvia a musa, e assim ela o ditava, assim ele escrevia. Poetar não é pensar. É despir-se do pensamento e ficar a sós com a mente, despir-se de todo o pensamento que a única coisa que resta é o silêncio. Mas esse silêncio não se faz de ausências de sons, faz-se antes de presenças de sentires, de sensações. Não é o suster da respiração, é a respiração correndo alegremente como gota de água num riacho que se sabe que, mais tarde ou mais cedo, acabará no mar. Poesia é deixar-se levar. Escutar a voz da musa. Ninguém escreve sob efeito de programação informática. O melhor linguísta é o pior poeta. O poeta apenas dá porque recebe de mais alto, é canal, conivente, é certo, mas não agente. Como um crivo que filtra água da chuva e retém, por vezes, uma pequena folha, ou um rebento, ora mais tenro, ora mais seco. E o ritmo, o passar da água, essa cadência, o fluir, o que vem e o que veio, o que é faz-se poesia. O monstro do Dr. Frankenstein não enlouqueceu porque tinha uma aparência medonha, ele enlouqueceu, sim, porque ninguém lhe mostrava afecto.

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