Há esse enorme desafio no meu país de que a terra se reconcilie consigo própria, e eu escrevi um livro que se chama Estórias Abensonhadas. Esse termo abensonhadas surgiu no dia em que Moçambique, depois desse tempo amargo de guerra, conquistou a paz. Foi assinado o acordo de paz, e eu pensava que ia encontrar as pessoas festejando na rua, porque havia uma imensa alegria escondida por trás daquele acontecimento oficial. Mas ninguém saiu para a rua. Uma semana depois, sim, as pessoas saíram para a rua porque choveu. Então, eu vi que a mesma razão que ditava a guerra, que eram os antepassados, os deuses antepassados estavam zangados com os homens, esses mesmos deuses tinham aprisionado as chuvas. E o fato de eles terem liberado a chuva , agora significava que sim, que era verdade a notícia de paz; vinha não pelo rádio, não pelo jornal, mas pela própria chuva. Daí a chuva ser tida como abençoada, como sonhada, como abensonhada.
Mia Couto
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário