terça-feira, 20 de novembro de 2007

o tédio, o cansaço, o tédio, o cansaço,

O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas -
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço...

Álvaro de Campos

2 comentários:

player1331 disse...

supressíssimo íssimo issimo cansaço...
one of my favourites...

como te compreendo :P

Daniel disse...

vezes há em que um cansaço tão grande como o de Álvaro de Campos se apodera de nós e, tal como Reis, só nos apetece desenlaçar as mãos de Lídia e contemplar o firme lago mudo. Mas sendo esse um estado de alma é, portanto, também um estado volúvel e transitório, cedo fica e cedo passa, deixando no seu lugar aquilo que move outro e que por outro não é movido. O cansaço é a nossa condição de humanos, mas a verdade está para além de todo esse cansaço, está para além até do descanso. A verdade está à vista de todos e escondida de nós: somos nós próprios.